23 dezembro, 2006

Natal?


Lembro-me que na minha infância e até adolescência neste período de dezembro até meados do dia 25 era comemorado o nascimento de Jesus. Fazia-se até peças teatrais na igreja sobre o nascimento virginal de Cristo. Entretanto, mais que isso era comemorado a vinda do Messias em forma humana à terra.

Teologicamente falando não vemos nem uma alusão neo-testamentária e pós-igreja apostólica na Bíblia relacionada a comemorações do nascimento de Cristo. Claro que estou me referindo aos fatos após a assenção de Jesus aos céus. Mas o fato é quanto a relevância desta data para nós cristãos. Será se precisamos do natal para lembrar que Jesus nasceu e um dia veio a este mundo como homem? Já respondendo, penso que de certa forma sim. Explico:

Embora muitos advogam a abolição do natal, visto que esta data como sabemos, historicamente é oriunda de práticas pagãs. No entanto, se partimos do ponto de vista que nós humanos somos tendentes a esquecer as verdades contidas nas escrituras sagradas e abadoná-las facilmente, pelo nosso estado decaído de pecado, logo podemos concluir tentando buscar uma coerência de que não foi a toa que Jesus recomendou os seus discípulos a celebrar a Santa Ceia em memória dEle até que Ele retornasse. Porque em memória? E porque temos que celebrar a Santa Ceia? Percebam; o natal em si para muitos relembra bons momentos apenas. As vezes presentes, Papai Noel (origem pagã), "amor e paz", ceia e peru de natal com a família.

Mas fundamentalmente esta data tem um valor muito mais significante. Independentemente se Jesus nasceu em outubro como advogam alguns, outros em novembro (diga-se de passagem o calendário judaico diferia e ainda difere do calendário das demais culturas); o fato é que Jesus veio ao mundo, nasceu, viveu e morreu, ressuscitando para dar vida a nós por sua vitória sobre o pecado. Não importa se foi em dezembro. O que importa é que esta data é apenas mais uma oportunidade de comemorarmos e relembrarmos tão marcante evento para a humanidade: o nascimento de Jesus Cristo. O grande exemplo disso foi a festa dos pastores, dos magos e dos anjos nos céus.

Apesar de cada vez mais lamentavelmente esta data tem tornado-se um momento comercial para o mundo capitalista, com o papai Noel como garoto-propaganda do marketing do natal, prefiro manter o mesmo espírito natalino que tinha na minha infância e adolescência, e ser mais grato a Deus pelo nascimento de seu Filho Jesus. Obrigado Deus, pelo teu amor, que nos amou de tal maneira que deu seu único Filho!

Viva o natal e a redenção de Cristo Jesus!!

21 dezembro, 2006

A Pregação Cristã e o Antropocentrismo


Sabemos que Jesus recuperou nEle mesmo o estado original do primeiro Adão antes de sua queda. Portanto o único acesso do homem a Deus, se dá por meio de Jesus Cristo. Não restando nenhum mérito ao homem por nada que faça como que fazendo um favor a Jesus. Tudo a partir de Cristo é Graça e ao mesmo tempo Juízo. Entretanto, estamos presenciando um período complexo no meio evangelical, onde pregadores apoiados por pastores e líderes, estão lamentavelmente num frenético comercio de pregações "pré-cozidas" do tipo "fast food" a gosto do "fregês". Pregações cujo o pregador e seus jargões, clichês, técnicas emocionais e até cacoetes são o grande destaque. Enquanto Jesus, embora enfatizado durante os sermões, não passa de um "pano de fundo" ou figura "mitológica" diante do pregador. Pois este sim é o "ungido";o "atalaia"; o "grande homem de Deus";"o santo homem de Deus"; e uma infinidade de adjetivos que o elevam a um patamar, que só os sacerdotes e profetas do Antigo Testamento tinham exclusivamente. Ou seja: a pregação cristã parece está perdendo em alguns redutos, principalmente nos pentecostais e neos (não excluindo os demais redutos tradicionais), a noção da verdadeira pregação. Que não é antropocêntrica, isto é, em torno do homem, mas puramente cristocêntrica, a partir de Jesus e com Jesus, que pela sua graça transmite as verdades claras e intrínsecas do seu Evangelho através da Sua palavra.

13 dezembro, 2006

Somos "Pecadores"

Quem bater no peito e disser que não peca está mentindo. Herdamos uma natureza pecaminosa e por isto dependemos cem por cento da Graça de Deus. É ela quem nos faz mais humano no sentido original da palavra. Isto é, em Cristo nos tornamos um "Adão antes de pecar" e consequentemente alcançamos uma comunhão mais estreita com Deus através de Cristo. Porque na realidade, Deus nos olha no prisma de Jesus pois Ele sim, venceu o pecado.

Homem algum teria como vencer o pecado se não fosse a intervenção da Graça Divina através de Cristo Jesus. Parece óbvio para alguns o que estou falando, porém, vez por outra nos esquecemos do nosso estado natural de homem pecaminoso. Não obstante, o fato de esquecermos a nossa incipiência, queremos muitas vezes resolver, julgar e setenciar questões e pessoas como se fôssemos um ser auxiliar de Deus; um super-homem; ou um deus mesmo. Só o fato de agir assim já denunciamos o estado deplorável que nos encontramos. Mas graças a Deus que em Jesus nos encontramos, nos resolvemos e nos achamos, pois Ele nos faz recuperar nEle mesmo o estado original perdido por nosso primeiro ancestral, Adão.
Portanto, não adianta bater no peito e dizer que não peca. Pois tendemos a isso. Só não vivemos mergulhados no pecado. Vivemos sim revestidos com o Sangue de Jesus que purifica os nossos pecados. Ai de nós se não fosse Jesus. É por isto que tem muitas pessoas por aí se achando imbatíveis e intocáveis; cuidado! Isto mostra a arrogância "espiritual" de alguém que não quer admitir que é frágil e pecador.
Eu lhe pergunto: você fez ou arriscou fazer pão algum dia? Se sua pergunta for positiva, mesmo assim não quer dizer que você é um padeiro, concorda? Pois o padeiro é aquele que vive na prática de fazer pão. Assim somos nós "pecadores", ou seja, pecamos sem se programar para pecar, mas não vivemos na prática do pecado. Moral da história: Aquele que está em Cristo não é mais "profissional" do pecado, embora enquanto estiver neste corpo terreno nunca esqueça sua "profissão".

07 dezembro, 2006

Comecei as férias na Crise!

É pessoal... nunca esperava me ver dentro de um "tornado de crise". Nesta terça-feira (5/dez), pude provar qual a sensação de uma crise do sistema aéreo brasileiro. Posso sintetizar em uma palavra: "aterrorizante". Nunca imaginei que um dia passaria por uma situação daquelas, tão vexatória. Dormir em um saguão de aeroporto, enfrentar uma fila de mais de um kilômetro de pessoas estressadas, cansadas e doentes e ainda esperar mais um atraso de vôo foi só um dos ingredientes desta nossa(eu e esposa) saga. Mas em tudo isso pude extrair muitas lições de vida para mim. Aprendi através de algumas nuanças deste inesquecível momento ao observar o quanto o ser humano torna-se impotente diante de certas circunstâncias adversas. Ao observar o quanto somos dependentes de Deus e o quanto Ele cuida de nossas vidas fazendo tudo concorrer para o bem. Deus é capaz de parar aviões ou seja lá qual for o meio de transporte para livrar alguém que faz parte de seu projeto soberano. É um mistério que pertence ao Seu beneplácito. É por isto que louvo a este Deus gracioso a todo momento. Ele é Senhor e condutor de todas as circunstâncias. Portanto tudo concorre para o bem daqueles que amam a Ele.
Mas graças a Deus que chegamos em paz. E pensar que ontem estávamos em meio a um pesadelo real no aeroporto de Guarulhos -SP, e agora estamos aqui em Fortaleza-Ce, passando alguns dias "férias". Depois de um semestre bastante puxado academicamente, espero ser mais constante nos próximos posts deste blog. Está só começando a temporada de férias! Muita emoção ainda está por vir pela frente!!

18 novembro, 2006

O que Penso sobre Ortodoxia


Tenho percebido que algumas pessoas tem certas reservas quanto ao termo ortodoxia. Tais pessoas acredito eu, se pensam assim não sabe de fato o que a raiz do termo representa.

Vejamos a priori: O termo originariamente na etimologia da palavra vem da junção grega de ort(o) + doxia = orthodoxia. É denotado como um padrão normativo de regras ou doutrinas estabelecidas para serem seguidas como base de um modo de vida. É o contrário da heterodoxia, que se opõe a todo e qualquer padrão de normas ou regras estabelecidas por um grupo.

A ortodoxia em outras palavras é um conjunto de pilares ou sustentáculos que apoiam um determinado movimento. Seja ele no âmbito religioso, político, profissional, filosófico, enfim, é essencialmente a base de sustentação de qualquer movimento no qual contêm normas ou regras por meio de um estatuto ou outro parâmetro normativo.

O Cristianismo por exemplo, segue um padrão normativo que estabelece todo o modus vivendi de um cristão professo. Através da Bíblia, única regra de fé e prática de um cristão, é estabelecido todo o conjunto de normas e regras a serem seguidas por um discípulo de Cristo. Já estamos falando de ortodoxia pura; perceberam? porém, dentro do contexto bíblico-cristão.

Viram que não é nenhum "bicho de sete cabeças"?! Mas infelizmente alguns por estarem desinformados sobre o conceito do termo em sí, acabam criando um pré-conceito totalmente antagônico ao real sentido do termo, dando uma conotação equivocada para o mesmo.

Tem gente que confunde ortodoxia com fundamentalismo. O que não deixa de ter algo em comum. No entanto, o fundamentalismo em si nasceu através de um movimento religioso protestante e conservador nos EUA que enfatizavam a interpretação literal da Bíblia como fundamental a vida e as doutrinas cristãs. Entretanto, o fundamentalismo na minha opinião é uma corrente de visão ultra-conservadora que prega uma obediência rigorosa e conservadora dentro de um conjunto de doutrinas ou princípios seguidos por uma crença qualquer. Ao meu ver, isto em suma, não passa de um tipo clássico de legalismo. Ou seja, a obediência rigorosa e as vezes cega, mediante a uma lei ou regra estabelecida.

Perceberam algumas diferenças básicas em relação a ortodoxia? Pois é. Por isto prezo por uma ortodoxia teológica que serve de pilar para o sustentáculo de uma fé genuinamente bíblica-cristã. Agora por favor não me confundam como um fundamentalista. De "fundamentalismo" só o equilibrio e a coerência na ortodoxia dentro da teologia propriamente dita. Fui claro?

24 outubro, 2006

Cristo: "O estigma evangelical"

Vivemos uma onda de cristandade! Ou melhor, eu diria, uma "tsunami" de cristianismos(?) que mais se parece com uma espécie de cristianização psicológica em massa. Porém, o que vemos no meio disso tudo é muita "fumaça" e pouco "fogo". O que quero dizer com isto?

O mundo evangelical estigmatiza uma vida cristã autêntica; paradoxalmente a uma vida aparentemente cristã dentro do que é hoje o politicamente correto. Quando falo de uma vida cristã autêntica, refiro-me a viver nos padrões estabelecidos a partir de Cristo e sua Igreja através de Seus Apóstolos. No entanto, assistimos hoje a um avanço de seguidores de um tipo de cristo a partir do homem. Daí os "ismos" como o humanismo, utilitarismo, teorismo, academicismo... e uma série interminável de "ismos". Não quero dizer com isto que tudo que termina em "ismo" não é verdadeiro. Mas o foco é o que é relevante para o nosso conceito de verdadeito cristianismo. O que quero dizer é que tudo isto é um reflexo de uma falsa pregação que hoje está em voga: "um cristo antropocêntrico". Cristo a partir do homem, e não o homem a partir de Cristo. Por tanto, partindo desta premissa, Cristo passa ter uma perspectiva fatalmente estigmática, onde a genuína fé bíblica-cristã é mutilada pelas correntes humanistas, um forte braço da influência satânica do anti-cristo no presente século.

Abramos os olhos enquanto é tempo! O verdadeiro Cristo está voltando!
Enquanto isso muitos estão engodados por uma visão distorcida do que a Bíblia orienta. A verdadeira igreja não estigmatiza Cristo. Ao contrário, o tem como o seu Grande Paradigma! Pois na contra-mão da tendência pós-moderna, que é de teorizar, psicologizar e utilizar o nome cristo em seu bel prazer, vive Cristo de forma central, prática e ativa. É o sal e a luz da terra! Por isso incomoda o reino das trevas. Este é o Cristianismo Puro e Singelo. Entretanto, revestido com o poder de Deus!

20 outubro, 2006

Breve Comentário sobre as coisas que se podem colocar em dúvida na perspectiva de Descartes

Num invólucro racional, lógico e mentalístico dubitável, ao passo que concomitantemente antagônico à mente humana em face aos princípios fundamentais da ciência, Descartes busca em sua primeira meditação desconstruir antigas idéias estabelecidas com base no senso comum e subjetivo. Senso este adquirido segundo ele, a partir de falsas opiniões como se fossem verdadeiras. Estas precisam ser demolidas e reconstruídas com base em uma premissa sólida e bem fundamentada.
Podemos em uma breve inferência, meditar naquilo que poderíamos raciocinar como idéias que herdamos de conceitos superficiais e inconstantes ao longo do tempo de nossas vidas através de opiniões mal elaboradas que nos conduzem a agirmos equivocadamente em torno de uma suposta verdade. Seria isto na concepção cartesiana o nosso “gênio maligno”?
Descartes desenvolve alguns princípios argumentativos em torno das coisas que se podem colocar em dúvida. Nesse campo elocubrativo a dúvida é posta em prática. Ou seja, o surgimento da menor partícula de dúvida poderá comprometer toda a estrutura de valores atribuídos a uma determinada idéia. Para não incorrer na infinita tarefa de examinar particularmente uma a uma, Descartes concentra seu foco no cerne da sua estrutura de pensamento. Ele a configura mentalmente como o alicerce de um edifício. Nestas “ruínas dos alicerces” todas as suas antigas opiniões estavam apoiadas. Uma “pedra de dúvida” deste alicerce mental poderá comprometer toda a sua infra-estrutura. Portanto será prudente “nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez”,
Conseguintemente, como que num refinamento de idéias, Descartes nos leva a uma dúvida mais profunda do que representa de fato os nossos sentidos. Eles parecem apenas reproduzir de modo abstrato assim como num sonho à semelhança de algo real e verdadeiro. Na realidade, os nossos corpos e membros como mãos e pés, são verdadeiros e existentes. Porém nossos pensamentos vagueiam por sentidos transitórios num universo de coisas reais e ao mesmo tempo irreais à medida que o projetamos em nossa psiquê. Com base nisto poderíamos fazer uma pergunta: Estaríamos assim de forma cartesiana diante “do Deus enganador”?
Deste modo, as ciências dependentes da consideração das coisas compostas são muito duvidosas e incertas. No entanto, segundo Descartes, “as ciências que tratam de coisas muito simples e muito gerais, sem cuidarem muito se elas existem ou não na natureza, contêm alguma coisa de certo e indubitável”. Um exemplo disso é a Aritmética e a Geometria.
Entretanto, Descartes a despeito de tudo isto tem em seu espírito certa opinião de que há um Deus que tudo pode. Com um critério metodológico, ele nos remete a onipotência de Deus, o qual tem todo o poder a ponto de confundir o homem em suas faculdades elucubrativas. E tem toda liberdade para tal. Isto parece uma atribuição de um certo grau de malignidade em Deus. Mas afinal, quem somos nós para questionarmos um Deus soberanamente bom? Ainda que duvidássemos de sua bondade, não poderíamos duvidar acima do que Ele nos permita. Pois sendo um Deus Soberano, está muito além de nossas convenções lógicas e factíveis a respeito do que é bom e do que é mal.
Assim sendo, Descartes nesta primeira meditação nos mostra as razões apresentadas em função das ciências, que nos leva a uma episteme; que por um processo cognitivo nos leva a uma lógica apoiada nos nossos sentidos. Contudo, estas coisas são todas dubitáveis. Não obstante a inexorável grandeza de Deus como soberana fonte da verdade, podemos parafrasear nas palavras de Descartes: “Pensaremos que o céu, o ar, a terra, as cores, as figuras, os sons e todas as coisas exteriores que vemos são apenas ilusões e enganos de que Deus se serve para surpreender a nossa credulidade”.

12 outubro, 2006

A Solução da Razão...


Por: Josebel Wolter

Muitas palavras vãs
E sentidos duplos nas mentes
Mentes estas sans
Sentidos duvidosos simplesmente
O que pensar
De todas estas questões
Não é só falar
Nem sentir nos corações
Mas o que é tudo isso?
O que você quer buscar?
Você se torna omisso
Se tentar apenas decifrar
Segredos, pensamentos, construções
Tudo é tão difuso
Para muitos traz descontruções
E os tornam tão confusos
Mas o que o ser humano quer?
Não posso entender
Sou como outro qualquer
Mas Deus pode tudo saber
Podem surgir explicações
Para as coisas entender
Mas não passam de reflexões
Ou algo para se crer
Buscar
Perscrutar
Pensar
Fisolosofar
Será que isso basta?
Será que existe a solução?
Será que as dúvidas afasta?
Ou apenas a razão?
Não posso saber
Pois sou muito falha
Apenas posso crer
Que Deus sempre trabalha
Para o ser humano saber
Todo o seu querer!

ANDEI SUMIDO....

Pois é meus caros blogueiros. Andei meio foragido por alguns dias do mundo dos blogs. Mas estamos aqui de volta. Nesta metade de semestre aqui na faculdade não está sendo moleza! Muitos trabalhos, pesquisas, enfim, vida acadêmica. Todo mundo correndo atrás. Mas Deus tem nos dado graça para tentarmos conciliar as coisas e tocarmos o barco a frente. Vamos tentar recomeçar? Então para iniciar vou deixando um poema filosófico de autoria da minha querida esposa. É para refletir. Sinta só!

14 setembro, 2006

Comentários Ontológicos Sobre a Existência de Deus Na Perspectiva de Anselmo

Num silogismo envolto à uma profunda análise metafísica embasado na racionalidade humana, Anselmo inicia sua busca argumentativa no anseio de encontrar um único argumento que valide, “em si e por si”, capaz de demonstrar que Deus existe verdadeiramente e que ele é o bem supremo; quando ao contrário, todos os seres dependem dEle para existirem e serem bons[1].
Entretanto, na tentativa de encontrar um argumento sólido como prova adequada naquilo que cremos acerca da substância Divina, à luz de Anselmo, esbarramos no não translúcido de nossa entenebrecida mente humana. Como num lapso, “justamente no calor do conflito de pensamentos”, em paráfrase à nossa humanidade, assim como a de Anselmo, somos levados a uma sublimação do ser através de um estado elevado da mente até a contemplação de Deus - num lampejo de fé fundamentado na razão. O que analogísticamente em um estado humano de pós-queda seria inconcebível tal vislumbre sem uma transcendência.
Na nossa insipiência, por conseguinte, devemos convir que nada podemos pensar de maior além do inteligível. Assim sendo, “o ser do qual não é possível pensar nada maior”, é tão real quanto a nossa racionalidade. Basta só seguir uma simpleza lógica, da qual não poderia existir nenhum ser menor sem antes existir um maior, e que se o menor existe, e este é o insipiente, por conseqüência, o ser maior não cabe e nem pode existir apenas na razão. Logo, “o ser do qual não se pode pensar nada maior” existe, na inteligência e realidade[2].
Deste modo, epistemologicamente por meio de uma dialética entre a razão e a fé, podemos concluir assim como Anselmo, “que não é possível pensar que Deus não existe”[3].
Ancorado nesta idéia, Anselmo em mais uma de suas assertivas de que lhes são peculiares, ao afirmar que a possibilidade de pensarmos na existência de um ser que não admite ser pensado como não existente, já defronta nossa inteligência com a realidade. Ou seja, a realidade não cabe no nosso embaciado pensamento, o que nos remete indubitavelmente a este “ser do qual não é possível pensar nada maior”; e existe de tal forma, que nem sequer é admitido pensá-lo como não existente[4]. Este é o nosso Criador e Soberano Senhor.
Em palavras rebuscadas de ontologia, Anselmo agora num magistral diálogo com Deus, põe-se nos limítrofes humanos - reconhecendo seu estado de criatura diante do Criador. O contrário disto seria uma aberrância de um delírio da criação, o que já seria inimaginável.
De fato, na nossa inépcia humanidade decaída, não podemos dizer em nosso coração aquilo que nem sequer é possível pensar. E se dizemos, logo pensamos, e se pensamos nos valemos de fundamentos lógicos convencionados por nossa mera racionalidade. Ora, diante disto, a realidade passa a ser ilógica, pois a mesma é infinita e desconectada dos fundamentos da razão. Abrindo um rápido parêntese, isto nos remete a um pouco de Immanuel Kant em uma de suas abordagens sobre o idealismo transcendental[5].
Anselmo usando sua retórica inquisitiva, num ato de reconhecimento, agradece a Deus pelo dom da fé, que com a luz da razão nos faz compreender e admitir racionalmente a Sua existência.
Portanto, ao buscarmos apoiar a fé na razão, desembocamos em ume estado transcendente que nos leva ao escopo da fé oriunda da imanência de Deus em nós. No qual não é possível pensar nada maior do que aquilo que Ele nos leva a alcançar pelos seus atributos Divinos[6]; os quais o fazem um ser ilógico diante da lógica humana. Logo necessitamos desesperadamente de sua luz, isto é, da Substância Divina imanente em nosso ser. Se não fosse o fator imanente da Sua presença, não existiria amor real. Pois este, inexoravelmente foi manifestado de forma corpórea no homem através da encarnação, morte, e ressurreição de Jesus Cristo[7]. Este fato é mais uma prova inconteste da Supremacia e Onipotência da realidade existencial de um Deus que é o “Pai da Eternidade” e o começo e o fim de todas as coisas. Em suma, como diria Anselmo, “Sua imensidade é indeterminável”[8].
[1] Proêmio, pág. 97
[2] Capítulo II, pág. 102
[3] Capítulo III, pág. 103
[4] Capítulo III, pág. 103
[5] Crítica da Razão Pura, Immanuel Kant
[6] Capítulos V, VI e VII
[7] Capítulos IX, X , XI e XII
[8] Capítulo XXI

03 setembro, 2006

Fariseus Pós-modernos

Antes de entrar no assunto gostaria de abrir um parêntese para dizer que tenho passados alguns dias sem postar nada. O motivo: estou naquela corrida acadêmica! Mas agora espero retomar as coisas novamente aqui no blog.

E para variar estou voltando com um assunto que tem chamado a minha atenção nesses últimos dias.

A igreja evangélica brasileira passa por uma crise sem precedentes na história do evangelho no Brasil. É público e notório os escândalos que a cada dia explodem como bombas de efeitos devastadores no meio evangelical. Isto porque envolvem principalmente líderes e pastores que na maioria das vezes carregam suas comunidades nas costas, e por consequência, quando estes líderes caem suas comunidades são praticamente dizimadas.

A bíblia fala em "ventos de doutrinas", mas na realidade estamos vivendo uma verdadeira temporada de furacões de teologias enlatadas com o rótulo patenteado por esses tais líderes e pastores, que estão escrevendo seus próprios livros como como se fossem detentores dos direitos autorais da própria Bíblia. Como se não bastasse, buscam atrair as massas com suas táticas marketeiras usando programas de tv, internet e outros meios para vender seus produtos. Investem em conglomerados de empresas como editoras, gravadoras, livrarias e até emissoras de rádio e tvs para expandir suas pretensas visões teológicas.

Vivemos num verdadeiro emaranhado de "verdades teológicas". Cada um defende seu peixe mirando o seu publico alvo. Hoje mesmo li uma notícia que dizia que uma grande "igreja" comandada por um tal apóstolo, o qual foi denunciado pelo ministério público sob a acusação de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Lamentei pelas pessoas inocentes e incautas que frequentam tal denominação. Os fariseus pós-modernos estão nos púlpitos arrebanhando pessoas inocentes por todo o Brasil. Ainda bem que Deus não tem o inocente por culpado e nem vice-versa.

15 agosto, 2006

Breve comentário sobre: "O homem e o tempo na perspectiva de Agostinho"

Paradoxalmente à presciência de Deus, não obstante ao fato de confessarmos nossas misérias a Ele, parece redundante. Porém, somos chamados por Ele para sermos pobres de espírito e mansos, para termos fome e sede de justiça, e por conseqüência sermos misericordiosos, puros e pacíficos. A confissão de tudo isto patenteia o nosso amor a Deus.
Agostinho em sua oração evocando as “bem aventuranças” de Jesus, resultado de uma confissão humilde de reconhecimento do estado humano limitado e de pecado, nos leva a uma compreensão empírica de que embora Deus como o Senhor da eternidade, vendo no tempo o que se passa no tempo, deseja mesmo assim nossas confissões e petições. Isto é como uma forma de excitação do nosso afeto com Ele.
Com grande destreza Agostinho no leva a pensar que diante da grandeza das palavras Divinas ao passo que a tornam enigmáticas e distantes da total compreensão humana, o tempo é por demais-precioso para enumerar todas as solicitações, terrores, consolações e incitamentos que Deus nos introduziu a pregar a Sua palavra e a Sua doutrina ao povo.
A criação do céu e da terra é focalizada agora sob o prisma de Moisés, pelo qual Agostinho desejaria saber o sentido da frase “No princípio criaste o céu e a terra”. Mas como Agostinho saberia se Moisés falava a verdade? Seria uma mera tentativa humana de encontrar respostas limitadas no tempo pela transitoriedade das palavras?
A alternativa de Agostinho imediatamente a isto, é poematizar a criação, tendo Deus como o Grande Criador e protagonista que sujeitou o céu e a terra às suas mudanças e vicissitudes. Logo Ele é a palavra criadora, procedendo como um artífice que forma um corpo de outro corpo, impondo-lhe, segundo a concepção da sua mente vigorosa. As indagações permeiam ainda o cerne do sentido axiomático da criação. Agostinho usando uma retórica peculiar as suas assertivas, indaga: “Que criatura existe que não exija a Vossa existência?”. A conclusão é sucinta: Deus falou e os seres foram criados. “Vós os criastes pelas vossas palavras”.
A despeito disto, Agostinho interpele: Mas como é que falastes? Na busca da resposta ele faz a seguinte indagação: “ Porventura do mesmo modo como quanto se ouviu de entre a nuvem a voz que dizia: “Este é o meu Filho predileto”?” É notório o aspecto didático nas palavras de Agostinho. Quando ressalta o fator das palavras transitórias que são absorvidas por ouvidos externos, à inteligência que as compreende e cujos órgãos interiores da audição estão dispostos para escutarem o Vosso Verbo Eterno.
Como convidados a compreender o Verbo, somos instigados por Agostinho a pensar no Verbo eterno e coeterno com Deus, o qual é pronunciado por toda a eternidade e no qual tudo é pronunciado eternamente. Não há diferença nenhuma entre o dizer e o criar. Portanto, o que Deus faz com a Sua palavra se realiza simultaneamente e desde toda a eternidade. Assim Agostinho introduz seu pensamento em torno da eternidade relacionada ao tempo em que o homem está inserido.
Como discípulos do Verbo, ouvimos sua voz no nosso interior. Sua luz nos ilumina e nos faz mais sábios. No entanto, Sua vontade é soberana sobre todos os aspectos. Por conseguinte, nada seria criado sem antes existir a vontade do Criador. O tempo é limitado por Deus, pois o mesmo não pode medir a Sua Eternidade. Agostinho nos leva a refletir sobre o grau de pequenez humana numa excepcional indagação: “Quem poderá prender o coração do homem, para que pare e veja como a eternidade imóvel determina o futuro e o passado, não sendo nem passado e nem futuro?”
A eternidade de Deus impossibilita o homem, como ser temporal, portanto criatura, de alcançar a grandeza do seu Criador. Deus está acima do tempo, pois Ele é a própria existência. Se o homem depende do tempo e está sob seu domínio, imagine sua dependência de quem está acima do próprio tempo. Agostinho expõe isto de maneira sintética e objetiva relacionando-se a Deus: “Não houve tempo nenhum em que não fizésseis alguma coisa, pois fazíeis o próprio tempo”.
Portanto, é quase um impropério afirmarmos que o tempo divide-se em três: pretérito, presente e futuro. Se agimos dentro de uma limitação temporal, logo nos encontramos em um estado plenamente transitório, no qual devemos reconhecer que somos criaturas do Criador e também Senhor do próprio tempo. Que nos permite apenas experienciar a existência que nos é facultada pela vida, subordinada ao Eterno e Soberano Deus.

06 agosto, 2006

Jesus e Mamom. A parceria do século 21!(2)

Parece inconcebível imaginarmos tal parceria. Mas lamentavelmente estamos em vias de um evangelho comercial e adequado ao mercado, mascarado de "teologia contextualizada com a realidade pós-moderna". Tudo gira em torno do capital financeiro. Vejo lideranças no meio cristão mais preocupadas no crescimento de suas igrejas, como se as ovelhas fossem "clientes" em potencial, do que proclamar o evangelho de modo simples centrado em uma teologia eminentemente bíblica e despojada de humanismos. A propósito, o foco de certas igrejas hoje é o pragmatismo, ou seja, se todo mundo está aderindo a tal tendência, vamos junto nessa. Pois só assim acompanharemos o crescimento de nossas concorrentes. Tem até igreja "revolucionando" o mercado, usando novas terminologias administrativas: como em vez de pastor, gestor. Comercialmente e para efeito de uma administração eclesiástica pós-moderna soa melhor. E assim centenas de cristãos estão perdendo a visão do céu, e focando a vida em conceitos humanistas e utilitaristas que no fim não passam de mercenarismo barato. Usam o nome de Jesus com interesses capitalistas. Isto é anátema! É abominação! Aproveitam-se da liberdade que há na graça de Cristo, e a transformam em libertinagem. Infelizmente muitos estão fazendo parceria com mamom em nome de Jesus. Entretanto, ainda existe um remanescente fiel que não se curvou a este deus do século. Esses estão no anonimato. É a igreja invisível que não precisa de marketing para manter-se, pois esta é o próprio corpo de Cristo. E por isto, não precisa apelar para métodos ou fórmulas humanas, pois Ele mesmo é quem dá o crescimento. Não precisa promover-se pois é Ele é o próprio cabeça, e como Soberano e Supremo Pastor conhece Suas ovelhas. Este remanescente não ambiciona as coisas deste mundo, pois sabe que existe um tesouro preparado no sentido escatológico infinitamente mais precioso do que a imaginação humana pode alcançar. Esta igreja tem sua fé centrada verdadeiramente em um Jesus que não precisa e nunca dependerá de parceria alguma abaixo de sua onipotência.
Mamom só é parceiro do "jesus da nova era". Esse tem uma legião crescente de adeptos por todo o mundo com o rótulo de "cristãos e seguidores de Jesus".

30 julho, 2006

Jesus e Mamom. A Parceria do Século 21!

Hoje estava trocando "figurinhas" por telefone com um colega de ministério que mora nos EUA. Ele confidenciou-me que está desiludido com a atual realidade cristã na América. Sente que o foco do verdadeiro evangelho de pureza e renúncia está longe daquilo que hoje é pregado nos púlpitos das igrejas. Há uma busca frenética por dólares. Muito dinheiro no bolso. Igrejas prósperas. Mas pobres de visão espiritual e distantes do que é essencialmente um autêntico cristianismo. Ele dizia-me que tem pastores por lá que só aparecem na igreja aos domingos, onde a frequência é maior e conseqüentemente os dólares também. Visita nos lares, isso é coisa do passado. E o que mais preocupou-me , foi quando ele disse-me que 80% dos pastores que moram nos EUA atualmente, estão caindo nesta prática. Falei-lhe que aqui no Brasil o quadro não está tão diferente. Estamos envoltos em uma crise ministerial sem precedentes a nível nacional. Basta voltarmos a alguns dias atrás, quando recentemente muitos evangélicos até aplaudiram a matéria de capa da revista Veja sob o título: "O Pastor é Show!". Sinceramente, no meu entender, satirizaram o verdadeiro cristianismo bíblico. O que se viu foi uma ênfase nas novas metodologias e métodos pragmáticos desenvolvidos por líderes e pastores. Métodos estes que fogem dos padrões apostólicos da Bíblia, e da verdadeira praxe cristã. O que percebo em tudo isso é que "mamom" está infelizmente influenciando cada vez mais as igrejas por aí a fora. Estas igrejas estão construindo o seu "céu" aqui mesmo. E parecem propor a Jesus uma parceria com o próprio mamom. É mais atraente, mais agradável, mais sedutor..... continuo no próximo post....

21 julho, 2006

A COPA DA "FUTEBOLATRIA"

A copa do mundo acabou, é verdade. Porém, deixou algumas cenas de situações que presenciei durante os jogos, (principalmente do Brasil) na minha memória. E uma delas foi no jogo do Brasil contra a França. Durante o jogo, fiz questão de escrever alguns pensamentos que complementei com mais outros, logo após o apito final do juiz da referida partida. Os quais transcrevo abaixo:

Sábado 1 de julho de 2006

" Em Pleno jogo de copa do mundo, quartas-de-finais, a nação pára reverenciando o futebol representado nesta ocasião pela seleção brasileira. As ruas estão desertas. Nem parece uma cidade habitada. Daria para realizar um culto à Deus nas avenidas da cidade. Pois elas estão tão vazias quanto a maioria dos templos cristãos. O culto ao futebol prevalece. Parece que Deus de protagonista passa à um mero coadjante, pois agora o futebol passa a ser um caso de vida ou morte. Jesus? Jesus neste momento não passa de um bom "psicanalista" que entra em cena apenas em caso de derrota. O que causaria uma grande comoção e consequente depressão no país. Aí sim! Tudo volta a realidade. As igrejas lembram de seus cultos. Os pastores lembram de suas ovelhas, suas ovelhas lembram de seus pastores. Jesus é lembrado, não mais como apenas um "bom psicanalista", mas também como Senhor. Senhor? Ah claro, porque o futebol acabou e o Brasil perdeu para França mais uma vez. Do contrário seria apenas só mais um no meio dos "deuses encantados do futebol".

10 julho, 2006

"AS LAODICÉIAS" 2

Tenho demorado a postar nesses últimos dias devido as viagens de férias que temos feito, eu e minha esposa. Uma viagem ministerial, diga-se de passagem, pois embora de férias da faculdade, estamos à todo vapor pregando a palavra de Deus nas igrejas aqui em Santa Catarina.
No último post, incluí um artigo do jornalista e escritor Washington Araújo. Suas palavras ali escritas estampam uma realidade que reflete cada vez mais o cotidiano das igrejas chamadas pós-modernas ou liberais; como queiram. O "Deus mercado" está impondo um tipo de contra-cultura bíblica. Seduzindo muitos pastores e líderes à cairem na armadilha da matemática comercial. Ou seja, na lógica do mercado financeiro que comercializa tudo e mais um pouco, não importando os meios, mas os fins. Com isso, há um enfraquecimento e um consequente empobrecimento espiritual e teológico nas igrejas, culminando em uma rede de comércio de "produtos da fé". "Produtos" estes direcionados a todo tipo de público consumidor. Desde o mais intelectual e de condição financeira elevada, ao mais leigo e proletário, de condição sub-humana. As chamadas "igrejas emergentes", estão numa concorrência de mercado nunca antes vista. São criativos e inovam à cada dia, em busca do seu público alvo. Vale todas as estratagemas possíveis, que vão do marketing publicitário à ofertas mirabolantes de "milagres" e "prodígios" que nem os Apóstolos nos tempos de Cristo ousaram tanto. Nesses dias recebi um e-mail com uma notícia de que várias pessoas em São Paulo estão processando "igrejas", por terem sido enganadas pelas mesmas por promessas falsas de prosperidade e cura. Um casal chegou a vender seu apartamento e carro para participar de uma "capanha de fé", e por não receberem em troca o dobro do que tinha dado, entraram com uma ação judicial contra uma dessas tais "igrejas". Veja a que ponto estamos chegando. Lamentavelmente os escândalos de igrejas estão por aí batendo nas portas da sociedade através dos meios de comunicação. Na realidade sabemos que isso tudo é cumprimento bíblico; " Sabe, porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis..."( 2Tm 3.1). O "deus mercado" está influenciando infelizmente os cristãos a seguir os padrões seculares que só satisfazem a cobiça da carne. Por conseguinte, verificamos estas pseudo-igrejas crescendo de forma alarmante. Atraem "fiéis" em multidões que se auto-enganam num evangelho comprometido com o mundo e o pecado. Estes usam a máscara de cristão, mas nunca de fato experimentaram a essência do que é o evangelho pregado pelos apóstolos da Bíblia, do contrário seriam verdadeiros servos piedosos e dispostos a resistir a pressão do "deus mercado". O triste é que a igreja de Laodicéia citada no livro de Apocalipse, pode ser comparada hoje ao tipo de "igreja emergente e atual". Sua visão e ideologia está se transformando eu diria, quase que num padrão pragmático de gestão pastoral. Enquanto que o modelo da igreja de Filadélfia, à um padrão no mínimo fora de moda. Um estigma para as pós-modernas ou como o nome sugere: "laodicéias".

24 junho, 2006

AS "LAODICÉIAS"

Atualmente vivemos numa realidade eclesiástica bastante comprometedora à eclesiologia bíblica cristã. Igrejas com suas estruturas "faraônicas" que mais parecem com os palácios de um "reinado papal", desenvolvidos para sustentar "monarcas" em suntuosos aposentos. Com base em um sistema administrativo humanista, centrado em modelos corporativistas, que no fim beneficiam mais a si do que ao povo cristão[?]. Mas o "mercado" exige um tipo de igreja mais comercial, digo, mais "espiritual", e não o tipo primitivo da igreja "modelo cristocêntrico", inaugurada pelos Apóstolos de Jesus. Já que a mesma, não preenche os requisitos exigidos pelo "mercado gospel", onde seus clientes, digo, os cristãos evangélicos[?], estão cada vez mais ligados ao "mundo business" e influenciados através de seus líderes com a idéia mercadológica do século 21, promovem uma verdadeira concorrência entre "igrejas" com seus modernos e pragmáticos métodos de gestão empresarial. A propósito, no próximo post desejo continuar falando sobre tal assunto que já vem me incomodando à algum tempo. Mas antes, degustem este artigo que achei bastante interessante e relevante dentro do que abordei nesse post, até porque a fonte deste artigo não é evangélica, diga-se de passagem. O autor é o jornalista e escritor Washington Araújo. Sinta só:
" O comércio natalino em 2005 se superou. Das 9 da manhã do dia 23 às 17 horas do dia 24 de dezembro o principal Shopping Center de Brasília esteve aberto. Foram 32 horas de desenfreado consumismo, com direito à música de pequenos grupos de jazz e até um dj alternando freneticamente as músicas no estilo hip-hop ou ao ritmo bate-estaca. As pessoas parecem se “produzir” para seu tour de compras. Nesses ambientes ninguém vai com a roupa de bater no dia a dia e sim, com a melhor roupa, aquela que se usava em anos passados para se assistir à missa nos domingos. Em tudo há um clima assim meio religioso. E isso já começa pelo aspecto exterior, quando não precisamos forçar muito a imaginação para discernir a arquitetura estilizada das catedrais, com seus enormes pórticos, vitrais nas laterais e a imensa cúpula central de vidro a filtrar a luz do dia. Não deixa de ser o templo dedicado ao Deus Mercado. Ao fundo podíamos ouvir uma música pós-moderna, mais animada que aquela usada para entreter os pacientes nos consultórios dos dentistas. Mas, invariavelmente, nos últimos cinco minutos do ofício de vendas se consumar somos alertados pela música clássica, suave e terna, que varia de Chopin a Vivaldi. Nas belas vitrines, com luzes direcionais focadas nos objetos de desejo - geralmente os mais caros -, sempre postos delicadamente sobre uma almofada em cetim negro ou carmesim, onde resplandece um relógio-jóia da marca Rolex ou uma caneta-tinteiro Montblanc ou mesmo um par de brincos do mais translúcido diamante. E os olhares piedosos se aglomeram em volta de cada nicho. Existe um quê de devoção e deslumbramento, uma expressão de intensa satisfação, uma verbalização de regozijo: “Realmente, uma jóia divina!” Observei em minha última peregrinação no ParkShopping (foto) que tudo ali parecia me transportar a um outro mundo, uma mundo mais limpo e mais belo.
Estranhei – como sempre estranho – a ausência total de mendigos, de pessoas mal-vestidas ou maltrapilhas. Nenhum menino de rua com suas coloridas jujubas à venda, nenhum flanelinha a me chamar de tio. Nenhum sinal de miséria ou indigência aparente. Apenas aquela indescritível miséria da alma a nos mostrar que a opulência em países como os nossos parece ser uma afronta, um tapa na cara daqueles que têm sua dignidade humana usurpada, vilmente explorada.
Nas lojas de griffe, geralmente com nomes em francês (Elle et Lui) ou inglês (Crawford) encontrava as belas sacerdotisas com suas refinadas vestimentas, extremamente maquiadas e com perfumes a exercer a tirania da juventude e que, no conjunto da obra, pareciam ter lugar cativo na comissão de frente que leva ao Paraíso. No transcorrer da compra é que podíamos demonstrar nossa real classe social: os que podiam pagar à vista entravam direto no paraíso, os que podiam pagar em 3 ou 6 parcelas seriam aqueles que, por dever ofício, permaneceriam por 3 ou 6 meses no purgatório e, finalmente, os que não podiam pagar, seja porque não havia saldo no banco nem no cartão de crédito, eram constrangedoramente encaminhados para o inferno.
Ao final desse passeio litúrgico fomos todos nos reunir em volta da mesa eucarística do McDonald´s. Mas apenas Lara não abriu mão de seu McLanche Feliz e a família se aboletou em uma mesa do Dom Francisco. Nestes templos tudo é transitório, efêmero. Nada dura muito, a começar pelo aparelho do celular que logo se danifica e que logo esperamos que isso aconteça para voltar a escolher entre os 20 novos modelos mais modernos e mais cheios de funções. São templos das aparências. Quando uma loja oferece 50% de desconto em um determinado final de semana… é porque subiu 60% no final de semana anterior.
Enquanto a verdadeira religião busca nos unir em torno de bons sentimentos, de amplitude do coração, de renovação das forças da alma, a religião do consumo reforça em cada um de nós o sentimento de exclusão, de apartação e de egoísmo. Se a primeira nos acena com a beleza da vida após a morte, quando então nos livraremos deste corpo e de todas as milhares de roupas – com griffe ou sem griffe – com que o agasalhamos ao longo dos anos, a segunda nos faz perceber – embora tardiamente – a futilidade de nossa existência e temos então a frustração ao constatar que o jogo da nossa vida não foi inteiramente jogado. Se a verdadeira religião nos ensina a sermos pessoas melhores, pessoas solidárias e cheias de amor e compaixão para com nosso semelhante, enfim humanos mais humanos a religião do consumo nos oferece ao fim desta vida passageira nada mais que um bom enterro de luxo, com direito a muitas corbeilles, a um caixão em madeira-de-lei, revestido de cetim branco e também uma solenidade fúnebre à altura de nossas posses. Quando isso acontece, podemos desde logo estar seguros de que nossa vida foi em vão. Pois, no final das contas, é bom estarmos bem cientes de que não levaremos nada de material conosco. Pois a beleza da vida está em nunca ter fim, em ultrapassarmos de um mundo a outro, com a mesma pureza de coração e a mesma serenidade de alma com que um dia fomos gerados. Nesse segundo caso teríamos um funeral simples, muito simples. Mas as lágrimas ali expressariam o amor sempre presente de pessoas que tanto amamos a nos dizer que faremos falta, muita falta.
Porque para quem tanto nos amou estaremos sempre vivos. E estes, não morrem nunca. "
Sentiu? Será se isto não são "as pedras clamando"? reflita. Continuo no próximo...

Fonte consultada:
http://www.ndnewsonline.com.br/index.php?a=mostra_araujo.php&ID_MATERIA=2182

06 junho, 2006

Os ortodoxos são "caretas" 2

Onde está o sábio? Onde está o erudito? Onde está o questionador desta era? Acaso não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo? (I Cor. 1.20)

Sabe, as vezes é patético vermos pessoas cristãs "brigando" entre si, como que a disputar quem é mais sábio ou melhor teologicamente. Nesses momentos lembro o quanto somos limitados e pecadores, carentes da graça de Deus. Mas essas tais pessoas parece que gostam de ostentar um certo grau de sabedoria e conhecimento humano. Ora, se tudo que fazemos deve ser para a glória de Deus, devemos também nos cuidar quanto a nossa postura "sábia" aos nossos próprios olhos. Foi esse o grande problema de Adão na hora de decidir obedecer ou não a ordem de Deus. Mas o que tem haver isso com a ortoxia? Simplesmente tudo. Pois afinal de contas os chamados liberais e neo-liberais, estão tentando à luz de sua pseudo-sabedoria desvirtuar a Bíblia através de novos conceitos puramente humanistas e utilitaristas. Ou seja, buscam alternativas menos "ortoxas" e mais adaptáveis a nova realidade sócio-cultural do mundo globalizado em que vivemos. Aos olhos destes tais, a visão "tradicional" do evangelho não cabe mais neste mundo pós-moderno. Em outras palavras, Deus parece que não é mais aquele dos profetas do Antigo Testamento, que exigia santidade, nem tão pouco que os usava para denunciar o pecado de uma nação apóstata. Claro, claro, a linguagem e os conhecimentos daquele tempo eram arcaicos comparados a realidade de hoje. Deus teve que que se modernizar na linguagem "popstar" de Cristo, afinal se não fosse assim o mundo não compreenderia Deus. Parece bonito né? Mas essa é uma filosofia barata e totalmente fora daquilo que foi, que é e que será o Deus Alfa e Ômega. O "EU SOU". Essa visão completamente infundada está se espalhando no mundo cristão[?] como uma praga que assola um rebanho de ovelhas. São pseudo-teólogos e pseudo-pastores que estão prestanto um des-serviço ao verdadeiro cristianismo através de uma completa relativização da Bíblia Sagrada. São esses tais que influenciados por esta onda de neo-ortoxia, desenbocando em um liberalismo disfarçado e até declarado, estão levando centenas e milhares de pessoas ao caminho da apostasia. Deixando-as tão fracas a ponto de seguirem qualquer vento de doutrina. São esses "sábios" homens eruditos, que com um discurso tão eloquente e retórico com alto poder de persuasão, que fazem hoje uma "igreja de sucesso". Uma igreja hodierna. Uma igreja "emergente". Se você se enamorou com ela, não fique triste. Bem vindo a "nova era"!; bem vindo a "geração Herry Potter" ou mesmo a de Dan Brow com seu "código Da Vinci". Mas se você é só mais um dos "caretas" ortodoxos que defendem a verdade absoluta contida na Bíblia como um livro inspirado por Deus, na contra-mão do pensamento moderno, não fique tão feliz assim; pois será Bem vindo apenas ao clube dos "quadrados" e "retrógrados" da teologia. Tem certeza que ainda quer continuar sendo um "careta" ortodoxo? eu quero.

31 maio, 2006

Os ortodoxos são "caretas"

Atualmente nos meios acadêmicos e até de igrejas, vivemos em "pé-de-guerra" entre conceitos ortodoxos e neo-ortodoxos, entre teologia e neo-teologia e por aí vai. Mais parece um "fogo cruzado" que só gera fumaça e confusão entre alguns pensadores cristãos. No meio dessa confusão toda, vem uma pergunta: "O que é mais importante, a teologia ou a filosofia? Os "neos" responderiam por certo que nem teologia e nem filosofia, mas as duas precisam uma da outra. Os "caretas", digo, os ortoxos, diriam nem teologia e nem filosofia por si só, mas a teologia puramente bíblica. Parece paradoxal estes conceitos entre si. Mas existe um grande abismo que separa estes dois modos de pensar. E é justamente esse abismo que vem motivando muitos pensadores(os chamados liberais e os neo-liberais) a décadas de anos atrás à tentarem construir "pontes conciliatórias" entre a ortodoxia e a neo-ortodoxia. Mas o que seria então estas "pontes conciliatórias"? O que se houve falar de alguns pensadores nos meios academicos por aí a fora é que Karl Barth é tido como o "divisor de águas" entre a ortodoxia e a neo-ortodoxia. Com ele vem Brunner, Bultman e outros. O fato é que esses homens deixaram uma grande influência teológica ao mundo cristão contemporâneo. Fazendo hoje alguns teólogos afirmarem que a teologia depois de Karl Barth por exemplo, nunca mais foi a mesma. Realmente parece que nasceu a partir daí um um novo conceito em teologia, isto é, o pensamento moderno é aclopado a esse bojo, revolucionando e dando uma aparente nova interpretação da Bíblia. Felizmente levantaram-se pensadores "caretas" como Bonhoeffer e "um certo" Schaeffer que se opuseram contra a extinção dos referenciais absolutos da Bíblia impostos pelo pensamento moderno. E até hoje seus escritos clamam como uma voz no deserto. Portanto, sem mais delongas, sendo bem franco, vejo essa "ponte concliliatória" mais como um meio termo entre o que é fundamentalmente a verdade bíblica, defendida pelos "caretas" ortodoxos, e o que é "politicamente", digo, "filosoficamente mais correto". Na realidade, em suma, isso está mais para uma tentativa de burlar o que já foi e é determinado por Deus como Sua palavra, "... que é viva e eficaz, e mais afiada que qualquer espada de dois gumes;" através de meros conceitos humanos. Esses tais esquecem que são apenas seres mortais. No entanto, como criaturas querem atingir o topo do saber e atingir o incognoscível. Lembra da torre de Babel?
Continuo no próximo post....

29 maio, 2006

ESTAMOS DE VOLTA!

Depois de alguns meses meio que fora do ar, voltamos com todo gás para mais uma temporada aqui na net. Desejamos interagir com vocês através da expressão de pensamentos cristãos direcionados a realidade teológica na qual vivemos atualmente como teólogos compromissados com a verdade bíblica sem sofismas, com toda a transparência e sinceridade possível. Portanto está aberta aqui neste blog a nova temporada de embates teológicos. Esteja a vontade para degustar.

15 fevereiro, 2006

Apóstolos ou Apóstatas?

Tenho refletido bastante nos últimos dias sobre a "nova onda do momento": Os Apóstolos do Século 21. É impressionante como estes "Apóstolos" estão em alta no meio dos "cristãos pós-modernos" de hoje. Talvez estão enfadados de ser pastoreados, afinal de contas, o título de pastor já se tornou tão popular que beira ao vulgar, ao comum; ou por significar um ofício trivial em certos redutos eclesiásticos. O fato é que esta "onda" é crescente. Confesso que estou preocupado com este quadro. Estes pseudo-apóstolos, estão se autopromovendo num marketing ostensivo, usando os meios de comunicação em massa e todas as fórmulas possíveis de propagação de suas ideologias e neoteologias.
Observo o desenrolar da história da Igreja atual indo num rumo de uma contra-reforma tão "revolucionária" quanto a própria reforma foi em sua época. São teologias mascaradas, na realidade eu diria falsificadas, cheias de subterfúgios e sem escrúpulo algum, torcem o verdadeiro evangelho deixado por Cristo e seus Apóstolos. Não por acaso que todos os Apóstolos de Jesus que escreveram no NT, deixaram um alerta quanto a falsos mestres. O próprio Jesus foi enfático quanto ao tema. Vemos no livro de Apocalípse Ele usando João para escrever ao anjo da Igreja em Éfeso, fazendo uma referência à alguns pseudo-apóstolos, que se auto-proclamavam, mas não tinham o seu apostolado dado por Jesus. A propósito, não existe e nem existirá sucessão apóstólica. Os apóstolos foram especificamente usados na fundação da Igreja do Senhor Jesus aqui na terra. Foram únicos. Este foi o propósito. Assim como não haverá outro Jesus foi para libertar o homem do pecado. Portanto, chega de falácias! De apóstolos chamados por homens! Isto para mim cheira a apóstatas! E você vai cair no conto?....

14 janeiro, 2006

O DESAFIO DE UMA TEOLOGIA LATINO AMERICANA


Desafios da Teologia Latino-americana para nossos dias
Paletra na Semana Teológica do Seminário Teológico Antonio Godoy Sobrinho(IPI do Brasil – Londrina)
A Teologia da Libertação (TdL) é parte integrante de minha formação teológica. Fui muito enriquecido quando fazia o curso de graduação em teologia, sobretudo pela hermenêutica da suspeita e a interpretação bíblica na ótica dos pobres, dos oprimidos e dos que ficaram à margem da sociedade, tal como Jesus. Tive a oportunidade de lecionar Teologia Latino-americana em alguns seminários, mas quando comecei minha carreira docente, a TdL estava exatamente iniciando sua fase de revisão, na época da queda do muro de Berlim e do fim dos modelos de governo socialistas e comunistas na Europa Oriental. Não lhes falo a vocês propriamente como um teólogo da libertação, mas como alguém que reconhece seu valor em minha formação. Desse modo, pretendo desenvolver aqui algumas idéias pontuando alguns desafios impostos pelo atual contexto.A Teologia da Libertação não nasceu nos gabinetes europeus ou norte-americanos, mas na experiência de luta pela sobrevivência na América Latina. Essa resistência, inspirada pela fé levou algumas pessoas a tentar compreender a fonte dessa fé e a se identificar com processos semelhantes narrados nas escrituras sagradas cristãs. Desse modo, a Teologia da Libertação colocou no centro de suas preocupações a prática de libertação a partir da tradição do Êxodo, dos profetas populares e de Jesus, e não tanto a clareza nas definições dogmáticas. Assim, sempre deu mais importância à ortopraxia que à ortodoxia. Chamou a atenção dos cristãos para a miséria e exclusão sofridas pela maioria dos seres humanos e denunciou os pressupostos ideológicos de boa parte das teologias do primeiro mundo, não apenas as de nítida inspiração conservadora ou carismática, mas também as tidas como “liberais”. Preocupada com uma questão não prioritariamente doutrinária, mas prática - a própria vida – acabou por tornar-se a mais ecumênica de todas as teologias recentes. Católicos e protestantes de diferentes formações suspenderam seus pressupostos confessionais e puderam se encontrar e trabalhar juntos em torno de um ideal bem mais digno do que a defesa das instituições eclesiásticas. Por isso a Tdl acabou incomodando setores do Vaticano e dos centros ideológicos protestantes. A partir daí, a Teologia da Libertação obrigou as demais correntes teológicas a se perguntarem por sua relevância social. Ou seja, não basta que as teologias sejam ortodoxas, que seus argumentos internos sejam bem trabalhados ou sua relevância dialogal com a sociedade secular sejam firmes. O método da correlaçao entre teologia e filosofia. As teologias devem estar a serviço do plano de Deus, e não do orgulho dogmático ou sistemático ou da legitimação institucional. Portanto, a Teologia da Libertação acabou revelando-se, primeiramente uma iniciativa com preocupações éticas e pastorais e só num segundo momento, se revelaram as preocupações ditas “dogmáticas” ou “sistemáticas”.Apesar disso tudo, afirma-se atualmente que a Teologia da Libertação chegou ao fim ou que está em crise. De fato, por um lado, os ânimos se arrefeceram bastante. As Comunidades Eclesiais de Base se enfraqueceram e as utopias sociais, embora não tenham morrido, encontram-se em nítido estado de sonolência, adormecidas à espera de um beijo que as desperte. Porém, a libertação ainda não aconteceu e, ao contrário, a opressão econômica e a exclusão social aumentam na América Latina e em outros lugares. Desse modo, ao invés de dizer que a TdL chegou ao fim, é preferível dizer que aquele momento inicial da TdL passou e que agora ela amadureceu e se ramificou em vários desdobramentos que oferecem novas possibilidades de trabalho para os/as novos/as pastores/as e teólogos/as em nosso continente.Naturalmente, como todo movimento vivo, a TdL tem se preocupado em identificar os novos desafios do momento em que vivemos e apresentar respostas teológicas e pastorais adequadas. No âmbito acadêmico, a partir dos anos oitenta alguns teólogos da libertação começaram a perceber que a opressão tem várias faces, e que a luta contra a opressão sócio-econômica era apenas uma delas. Essa percepção levou a uma ampliação do leque das preocupações da TdL, principalmente quando o conceito “excluídos” toma o lugar do conceito “pobre”. Nos primeiros vinte anos da TdL o lema era “opção preferencial pelos pobres”. De repente, no início dos anos noventa emerge o conceito de excluídos (que abrange as opressões culturais e levanta os direitos das mulheres, das culturas negras e indígenas, migrantes, dos grupos GLS etc). Essa ampliação das preocupações causou, ao mesmo tempo a primeira crise interna. Alguns dos que defendiam o conceito “excluídos” diziam que o conceito “pobre” era muito reducionista, uma vez que há opressões que não são apenas de natureza econômica. Porém, à medida que o conceito “excluídos” substitui o conceito “pobre”, alguns teólogos da libertação mais antigos reagiram, alertando para uma infiltração burguesa na teologia da libertação que retirava a preocupação para com os pobres. Essa tensão não foi negativa, pois proporcionou um amadurecimento na teologia da libertação, em pelo menos duas áreas. Por um lado, os teólogos mais preocupados com a dimensão econômica (Franz hinkelammert, Hugo Assmann, Julio de Santa Ana e, mais recentemente, Jung Mo Sung) passaram a dedicar muita atenção a essa área e produziram muitas obras preciosas e de qualidade que, infelizmente, ainda são pouco conhecidas na maioria dos seminários evangélicos. Hoje percebe-se melhor os fatores que causam a pobreza e a importância de se pensar em soluções globais para problemas globais. Cada vez mais me convenço de que essa é uma área que merece muita atenção. Trata-se de um grande desafio a todos que se interessam por pensar os problemas econômicos e buscar alternativas solidárias capazes de enfrentar e exorcizar os principados e potestades que dominam a economia mundial. Por parte daqueles que insistiam no conceito de “excluídos” e que eram chamados “burguesia da libertação”, muita coisa boa também surgiu, especificamente no que se refere à pastoral libertadora da classe-média e à consciência de que a libertação deve alcançar todos, não apenas os oprimidos, mas também os opressores ou os que se beneficiam da opressão. Diante dessa situação, meu objetivo nesta noite é bastante simples. Pensando no tema que vocês me propuseram: “Desafios da teologia latino-americana para nossos dias”, pretendo esboçar um panorama de como vejo a situação do estudo da teologia, particularmente no Brasil. Não pretendo falar em termos de toda a América Latina, porque o tempo não nos permitiria. Além disso, não vou lhes propor um roteiro, mas apenas compartilhar o modo como eu mesmo encaro os desafios teológicos para nosso tempo. Ao esboçar esse panorama estarei também apontando para as fontes onde percebo sinais renovadores para a teologia em nosso país. Num segundo momento, quero propor algumas possíveis pontes entre a teologia latino-americana, que não pode perder de vistas nossas preocupações imediatas, mas também não pode se isolar num provincianismo e fechar as costas para tudo o que acontece de positivo no hemisfério norte. Ou seja, para mim, o grande desafio atual é estabelecer pontes entre o contexto da pós-modernidade e a teologia da libertação.
I - A situação da teologia no Brasil.
No âmbito católico-romano Após o Concílio Vaticano I houve uma grande efervescência na teologia católica brasileira. Porém, a partir do papado de João Paulo II, gradativamente essa teologia começou a ser vigiada e seus representantes, perseguidos. O símbolo maior disso se deu quando no início dos anos oitenta, Leonardo Boff foi condenado a um tempo de silêncio obsequioso por causa do livro “Igreja, Carisma e Poder”, uma avaliação crítica da estrutura eclesiástica Católica Romana. Aos poucos, as instâncias de poder do Vaticano conseguiram minar também o trabalho das Comunidades Eclesiais de Base, fechar ou “reorganizar” seminários, dividir dioceses a fim de enfraquecer os movimentos mais críticos (como aconteceu na Arquidiocese de São Paulo) e silenciar teólogos. Em contrapartida, o Vaticano apoiou movimentos mais conservadores e pouco-críticos, destinados a atrair pessoas de volta à Igreja, o que tem conseguido com relativo sucesso através das missas-shows do Padre Marcelo, dos movimentos de renovação carismática e de pastorais ou movimentos voltados para a classe-média, como é o caso dos Focolares, Encontros de Casais com Cristo, etc. Alguns desses movimentos são apoiados financeiramente por grupos católicos extremamente conservadores e que atuam na surdina, como a Opus Dei. Atualmente, predomina nos principais centros de formação, uma orientação teológica atrelada às linhas atuais do Vaticano, estabelecidas no papado de João Paulo II. Boa parte dos atuais seminaristas e futuros padres da Igreja Católica Romana pouco conhecem dos fundamentos teóricos e metodológicos da TdL. Sinais de renovação teológica no âmbito do catolicismo romano só são vistos em alguns seminários, em cursos organizados por ONGs e movimentos internos (como a “Nova Igreja”) ou grupos ecumênicos como o CESEP e CEBI que, por não estarem atrelados diretamente à hierarquia romana, têm um pouco mais de liberdade de ação, embora lhes faltem os recursos financeiros. Não vejo, atualmente no catolicismo romano (ao menos em suas estruturas), sinais muito visíveis de fortalecimento de uma teologia crítica e diferente da que aí está, pois toda orientação teológica do Vaticano atualmente visa o fortalecimento da Igreja Católica Romana enquanto instituição. É claro que isso tudo pode mudar, de acordo com as orientações que emanarão do Vaticano após a eleição do sucessor de João Paulo II. Além disso, faz parte da fé, acreditar que o Espírito sempre pode reaparecer como vento que sacode as estruturas.2. No âmbito protestante tradicional A teologia feita nas Igrejas protestantes tradicionais do Brasil continua sendo herdeira da teologia dos missionários que trouxeram o protestantismo ao nosso país. Trata-se de uma teologia pouco aberta às relações ecumênicas, centrada no fortalecimento da instituição eclesiástica, de forte ênfase conversionista e recheada por uma densa camada de pietismo. Essa teologia sempre foi marcada muito mais pela repetição dos grandes manuais interpretativos dos líderes da Reforma, sobretudo aqueles surgidos nos seminários norte-americanos conservadores. Nos anos 60 e 70 surgiu no Brasil um bom grupo de teólogos dispostos a sacudir um pouco as igrejas protestantes tradicionais de sua letargia. Porém, tal como aconteceu no catolicismo romano, as igrejas protestantes tradicionais, conseguiram afastar essas vozes mais críticas e progressistas, que acabaram se refugiando em universidades ou migrando para outras atividades. Ocorre, porém, que os anos 80 e 90 trouxeram às igrejas protestantes tradicionais o impacto do movimento carismático, especialmente em sua capacidade para manter na igreja as gerações mais jovens, devidamente domesticadas através dos mantras religiosos entoados nos chamados “momentos de louvor”. Essa nova situação, ao mesmo tempo em que proporcionou às igrejas protestantes tradicionais uma sobrevida, também levou-as a uma série crise de identidade.Ultimamente, a crise financeira da maioria das igrejas tem levado seus líderes a considerar desperdício, o investimento feito em seminários e centros teológicos de pesquisa. A lógica da maioria das instituições nessas horas é sempre a mesma: ao invés de investir na formação teológica, é “mais sensato” reduzir gradativamente os investimentos em seminários e direcionar maior aporte financeiro a centros de formação missionária, onde os resultados são mais imediatos - num tempo mais curto, treina-se um missionário ou evangelista e passa-se sobre ele um verniz teológico, evitando, de preferência, que essa formação seja muito crítica. Semelhantemente ao que acontece no âmbito romano, os programas teológicos das igrejas protestantes também visam em primeiro lugar o fortalecimento da instituição e a garantia de sua continuidade, a partir da formação de lideranças que garantirão a reprodução da instituição. Por isso, no momento, não vejo nas instâncias institucionais das Igrejas Protestantes muitas possibilidades de renovação da teologia. No âmbito evangélico-carismático-pentecostal Reuni essas três palavras num mesmo “tipo ideal” talvez de modo prematuro. Em todo caso, penso que as bases teológicas dessas três expressões religiosas são muito semelhantes. As igrejas pentecostais são herdeiras do movimento pietista-wesleyano. Durante boa parte do século XX, algumas igrejas pentecostais no Brasil consideravam o estudo da “teologia”, coisa do demônio, sem perceber que todos os seus discursos, sermões, pregações, etc, são herdeiros de uma determinada teologia. Quando abandonaram essa ingenuidade inicial, alguns grupos pentecostais começaram a criar cursos, geralmente com o nome de “institutos bíblicos”, “cursos de formação de obreiros ou evangelistas”, etc. O objetivo principal era semelhante aos centros de formação missionária das igrejas protestantes tradicionais – oferecer aos futuros reprodutores do discurso institucional um conhecimento bíblico mínimo e, desse modo, garantir a reprodução da instituição. Geralmente nesses institutos bíblicos, a formação teológica é bastante rasa e introdutória, mas transmitida de modo a fazer com que os receptores acreditem que tudo o que precisam saber ou conhecer está ali e que tudo o que vier além daquilo, “é coisa do diabo”. Na minha experiência como professor de teologia, posso testemunhar de diversos alunos que tive oriundos de seminários ou institutos bíblicos dessa natureza, que chegaram ao curso de teologia apenas para cumprir a obrigação de estudar para conseguir um diploma. Mas vinham todos já com certezas absolutas. E ao final do primeiro ano, ou mesmo do primeiro semestre de estudo, descobriam que, até então, estavam se alimentando apenas de leite. Por ser um ensino reprodutivo, pouco aberto às pesquisas mais atuais da teologia e pouco aberto ao diálogo ecumênico, também não vejo nenhum sinal de que a renovação da teologia no Brasil possa vir desses grupos.4. No âmbito ecumênico A partir dos anos sessenta começou a se desenvolver no Brasil o movimento ecumênico de modo mais intenso. Diversos organismos e institutos ecumênicos foram criados nos bons tempos em que ainda havia muitas verbas para tanto. Apesar de alguns percalços, o movimento ecumênico só trouxe benefícios para a teologia no Brasil. A ASTE é um desses frutos, bem como organismos aqui já citados, como o CESEP e CEBI, além do CLAI, CEBEP, CONIC, o antigo CEDI, agora Koinonia e o Instituto Ecumênico de Pós-graduação em Ciências da Religião de São Bernardo do Campo, que, embora hospedado numa instituição confessional (Universidade Metodista), trabalha com bastante autonomia e liberdade. Fazendo um retrospecto dos últimos vinte ou trinta anos de produção teológica no Brasil, observo que tudo o que houve de novidade, de acréscimo, tudo o que não foi mera repetição, surgiu nesses ambientes ecumênicos mais arejados. O método popular de leitura da Bíblia, as articulações pastorais, a renovação litúrgica (ainda não encampada pelas Igrejas), a nova hinologia latino-americana, em geral foram produzidas por pessoas e grupos envolvidos no movimento ecumênico e não por iniciativas confessionais isoladas. Apesar de as igrejas protestantes tradicionais atualmente darem pouca atenção ao movimento ecumênico, esse é um dos poucos espaços onde vislumbro humanamente alguma esperança concreta para a renovação da teologia no Brasil. Se há algum conselho que eu possa dar aos meus alunos de teologia é esse: invistam seu tempo de férias, seus fins de semana livres, feriados, etc, na participação de encontros ecumênicos que estão sempre acontecendo pelo Brasil. Muita gente diz que não participa porque não são divulgados. Isso é preguiça de buscar informações. Procurem na internet os endereços de sites ecumênicos no Brasil (geralmente todos têm algum boletim informativo, ou pelo menos, o número do telefone). Quem procura, acha!5. No âmbito acadêmico Boa parte dos movimentos de renovação teológica não surgiu por esforços institucionais de igrejas estabelecidas. A história tem mostrado que todas as instituições tendem a se tornar conservadoras e a inibir a criatividade. Isso acontece também com as igrejas estabelecidas e com grupos pára-eclesiásticos institucionalizados. Se fizermos uma retrospectiva de tudo o que surgiu na teologia do século XX, por exemplo, veremos que as grandes pesquisas bíblicas no AT e NT, a aplicação da sociologia e da historiografia crítica aos textos bíblicos, a nova hermenêutica e as mais ousadas novidades teológicas sempre surgem primeiro em âmbitos acadêmicos – universidades e centros de pesquisa. Elas sempre estão à frente das Igrejas, e as igrejas só aos poucos vão assimilando, geralmente com bastante atraso, os resultados das novas pesquisas teológicas. Apenas alguns exemplos: Paul Tillich é um dos teólogos mais influentes do século XX. Nos anos 80 e 90 surgiram diversos grupos de estudo sobre o pensamento de Tillich em várias partes do mundo. Hoje há bem organizadas sociedades de estudo da teologia de Tillich nos EUA, Canadá, em vários países da Europa e uma aqui no Brasil. Porém, a recepção do pensamento de Tillich por parte das igrejas no Brasil ainda é diminuta. O mesmo pode ser dito na área de estudos bíblicos. O estudo de Gerd Theissen, Meeks, Ched Myers, Andrew Overman, o Context Group, etc, ainda é privilégio de poucos interessados em comprar algumas dessas obras já traduzidas ou pesquisar sobre elas na internet. Se me perguntarem pelos sinais de renovação teológica atualmente no mundo, eu lhes apontarei essas duas fontes: o mundo ecumênico e os centros de pesquisa acadêmicos. Se vocês não quiserem ser meros estudantes que reproduzirão a teologia já feita por outros, procurem se integrar com os centros de pesquisa teológica nas universidades e em grupos de estudo. Ali se faz pesquisa de ponta e muito do que é discutido hoje, só será assimilado pelas igrejas dentro de alguns anos, pois, na maioria dos casos, a Igreja está sempre atrasada em relação aos movimentos históricos. Conversando com alguns colegas que lecionam Teologia Contemporânea em diversos seminários, percebo que, para eles, teologia contemporânea anda significa estudar Barth, Bultmann e Tillich, que nem são mais “contemporâneos”, pois estão todos mortos. É claro, que boa parte dos novos estudantes precisa pelo menos ser iniciada nesses grandes nomes. Mas eu, particularmente, acho que Teologia Contemporânea diz respeito àquilo que está sendo produzido por gente viva, ativa e pouco conhecida. É claro que essa interação com a vida acadêmica não pode ser feita como um mero exercício de masturbação intelectual. Naturalmente, é imprescindível associar essa interação com a vida acadêmica à participação na comunhão da Igreja. A teologia deve ser serva da Igreja – uma instância crítica inseparável da comunhão, como a consciência, que não existe fora do ser, fora do corpo do indivíduo.
II. A situação do ensino de teologia no Brasil hoje
Na condição de professor de teologia já há um bom tempo, confesso-lhes que às vezes me sinto extremamente frustrado com a falta de interesse de nossos atuais estudantes em pesquisar com avidez o que há de mais recente na teologia. Tenho trabalhado como professor em Seminários Evangélicos presbiterianos, batistas, da Assembléia de Deus e interdenominacionais em diversos lugares e, tristemente, observo que nunca houve classes tão fracas de estudantes como nos últimos anos. No início de meu ministério docente, recordo-me que os alunos chegavam aos seminários bastante preparados biblicamente, com uma visão teológica razoavelmente ampla, com conhecimentos mínimos de história do cristianismo e com uma sede intelectual muito grande por penetrar no fascinante mundo da teologia cristã. Ultimamente, porém, aqueles que se matriculam em Seminários refletem a pobreza e mediocridade teológica que tomaram conta das igrejas evangélicas. Sempre pergunto aos calouros a respeito de suas convicções em relação ao chamado e à vocação. Pois outro dia, um calouro saiu-se com a brilhante resposta: “não passei em nenhum vestibular e comecei a sentir que Deus impedira meu acesso à universidade a fim de que eu me dedicasse ao ministério”. Trata-se do mais típico caso de “certeza da vocação” adquirida na ignorância. E, invariavelmente, esses são os alunos que mais transpiram preguiça intelectual. A grande maioria dos novos vocacionados chega aos Seminários influenciada pelos modismos que grassam no mundo evangélico. Alguns se autodenominam “levitas”. Outros, dizem que estão ali porque são vocacionados a ser “apóstolos”. Ultimamente qualquer pessoa que canta ou toca algum instrumento na Igreja, se autodenomina “levita”. Tento fazê-los compreender que os levitas, na antiga aliança, não apenas cantavam e tocavam instrumentos no Templo, como também cuidavam da higiene e limpeza do altar dos sacrifícios (afinal, muito sangue era derramado várias vezes por dia), além de constituírem até mesmo uma espécie de “força policial” para manter a ordem nas celebrações. Porém, hoje em dia, para os “novos levitas” basta saber tocar três acordes e fazer algumas coreografias aeróbicas durante o louvor para se sentirem com autoridade até mesmo para mudar a ordem dos cultos. Outros há, que se auto-intitulam “apóstolos”. Dentro de alguns dias teremos também “anjos”, “arcanjos”, “querubins” e “serafins”. No dia em que inventarem o ministério de “semi-deus” já não precisaremos mais sequer da Bíblia. Nunca pensei que fosse dizer isso, pois as pessoas que me conhecem geralmente me chamam de “progressista”. Entretanto, ultimamente, ando muito “saudosista” ou “nostálgico”. Tenho saudades de um tempo em que havia certa ordem nos cultos evangélicos, em que os cânticos e hinos estavam distribuídos equilibradamente na liturgia. Atualmente os chamados “momentos de louvor” mais se assemelham a show ensurdecedores prejudiciais à saúde ou de um sentimentalismo meloso. Muitas pessoas vão à Igreja muito mais por causa do “louvor” do que para ouvir a Palavra que regenera, orienta e exige de nós obediência. Certa ocasião convidei um aluno a participar de um culto contemplativo na minha Igreja, que seria dirigido por um colega que estava nos visitando. Colocamos o altar no centro do templo, apagamos as luzes e acendemos as velas, sentamo-nos todos em círculo e utilizamos um incenso bem suave para tornar o ambiente mais agradável e foi um lido um texto bíblico. Na liturgia anglicana, o sinal de que a liturgia está começando é o toque do sino e o acender das velas. Ficamos ali, algum tempo em silêncio, em oração, em meditação sobre o texto lido. Após algum tempo, esse aluno me cutucou e perguntou: “quando é que o culto vai começar? Estão esperando alguém?” E eu lhe respondi: “infelizmente, você já desperdiçou dez minutos de culto”. Esse é talvez o mais pernicioso efeito da cultura pop e da massificação musical em nossos dias. Perdemos a capacidade de rezar e celebrar no silêncio e na serenidade. Outro aluno, recentemente me disse: “se não houver música, não há culto”. Creio que, em parte, isso é reflexo da cultura pop, da influência da “Geração MTV”, que privilegia o som e o movimento e que é incapaz de perceber que Deus pode ser encontrado também na contemplação, meditação e no silêncio.Maraschin tem um artigo intitulado “Meia hora de silêncio”, baseado no texto de Apocalipse 8.1: “Quando o Cordeiro abriu o sétimo selo, houve no céu um silêncio de meia hora...”. Que lindo isso: meia hora de silêncio. Hoje não conseguimos nem um minuto. Quando pedimos um minuto de oração silenciosa na igreja, as pessoas ficam impacientes, tossem, batem os pés, tamburilam os dedos nos bancos, abrem a Bíblia... a conseqüência desse mundo que privilegia o som, a rapidez, e o movimento é a superficialidade também nos estudos teológicos. Seria muito bom se conseguíssemos em nossas disciplinas de liturgia fazer esse exercício espiritual: começar o culto com meia hora de silêncio, pois no texto do Apocalipse, esse silêncio é preparatório para um grande evento: um anjo pega um grande turíbulo cheio de incenso que simbolizam as orações da Igreja, enche-o com o fogo do altar e o despeja sobre a terra, causando trovões e terremoto como um sinal para que sete anjos toquem as sete trombetas anunciando a renovação do mundo... Mas no mundo pós-moderno não é isso que os jovens desejam. O que vocês desejam é rapidez, movimento e pouca concentração. Há, porém, uma diferença entre desejo e necessidade. Nem sempre o que se deseja é o que se necessita. Os jovens de nosso tempo, a começar de vocês que estão estudando teologia, precisam aprender a valorizar os ritmos pausados e lentos das liturgias meditativas e contemplativas. Nada mais prejudicial ao estudo da teologia do que os cursos de leitura dinâmica. Teologia e filosofia se aprendem de modo oposto – com leitura calma, pausada, refletida e reflexiva. Percebo também que alguns colegas pastores de outras igrejas freqüentemente manifestam a sensação de sentirem-se tolhidos e pressionados pelos diversos grupos de louvor. O mercado gospel cresceu muito em nosso país e, além de enriquecer os “artistas” e insuflar seus egos, passou a determinar até mesmo a “identidade” das igrejas evangélicas. Houve tempo em que um presbiteriano ou um batista sabiam dar razão de suas crenças. Atualmente, tudo parece estar se diluindo numa massa disforme. Trata-se da “xuxização” (“todo mundo batendo palma agora... todo mundo tá feliz? tá feliz!”) do mundo evangélico, liderada pelos “levitas” que aprisionam ideologicamente os ministros da Palavra. O apóstolo Paulo dizia que a Palavra não está aprisionada. Mas, em nossos dias, os ministros da Palavra, estão – cativos da cultura gospel. Tenho a impressão de que isso tudo é, em parte, reflexo de um antigo problema: o relacionamento do mundo evangélico com a cultura chamada “secular”. Amedrontados com as muitas opções que o “mundo” oferece, os pais preferem ter os filhos constantemente sob a mira dos olhos aos domingos, ainda que isso implique em modificar a identidade das Igrejas. E os pastores, reféns que são dos dízimos de onde retiram seus salários, rendem-se às conveniências, no estilo dos sacerdotes do Antigo Testamento. Um aluno disse-me que, no dia em que os evangélicos tomarem o poder no Brasil acabarão com o carnaval, as “folias de rei”, os cinemas, bares, danceterias etc. Assusta-me o fato de que o desenvolvimento dessa sub-cultura “gospel” torne o mundo evangélico tão guetizado que, se um dia, realmente os evangélicos tomarem o poder na sociedade, venham a desenvolver uma espécie de “Talibã evangélico”. Tal como as estátuas do Buda no Afeganistão, o “Cristo Redentor” estará com os dias contados.Esses jovens que passam o dia ouvindo rádios gospel e lendo textos de duvidosa qualidade teológica, de repente enxergam nos Seminários uma grande oportunidade de ascensão profissional e buscam em massa os mesmos. Nunca houve tanta afluência de jovens nos seminários como nos últimos anos. Quando eu lecionava aqui nesse seminário (STAGS), lembro-me que os colegas diziam que a Igreja, em breve teria problemas, pois o crescimento da Igreja não era proporcional ao número de jovens que todos os anos saíam dos Seminários como bacharéis em teologia, aptos para o exercício do ministério. A preocupação dos colegas era: onde a igreja iria colocar todos esses novos pastores? Na minha ingenuidade, sugeri que seria uma grande oportunidade missionária: enviá-los para iniciarem novas comunidades em zonas rurais e na periferia das cidades. Foi então que um colega, bastante sábio, retrucou: “Eles não querem. Recusam-se! Querem as Igrejas grandes, já formadas e estabelecidas, sem problemas financeiros”. De fato, percebi que alguns realmente se mostravam decepcionados ao saberem que teriam que começar seu ministério em um lugar pequeno, numa comunidade pobre, fazendo cultos nos lares, cantando às vezes “à capella” e sem o apoio dos amplificadores e mesas-de-som.Na maioria dos Seminários hoje, os alunos sabem o nome de todas as bandas gospel, mas não sabem quem foi Wesley, Lutero ou Calvino. Talvez até já tenham ouvido falar desses nomes, mas são para eles, personagens de um passado sem-importância e sobre o qual não vale a pena ler ou estudar. Talvez por isso eu e outros colegas professores nos sintamos hoje em dia como que “falando para as paredes”. Nem dá gosto mais preparar uma aula decente, pois na maioria das vezes temos sempre que “voltar aos rudimentos da fé” e dar aos vocacionados o leite que não recebem nas Igrejas. Várias vezes tive que mudar o rumo das aulas preparadas para falar de assuntos que antes discutíamos nas Escolas Dominicais. Não sei se isso acontece em todos os Seminários, mas em muitos lugares, o conteúdo e a profundidade de temas discutidos nos cursos de graduação pouco difere das aulas que ministrávamos na Escola Dominical para neófitos.
III – DESAFIOS PARA A TEOLOGIA LATINO-AMERICANA
Quero finalizar apontando-lhes alguns desafios para a teologia que fazemos no Brasil. O primeiro diz respeito à necessária ponte que devemos estabelecer hoje entre o depósito de saber acumulado pela teologia da libertação, a reserva de sentido libertador ainda existente em nossas igrejas e o contexto de pós-modernidade em que vivemos. a) O desafio da pós-modernidadePara quem não está muito informado sobre o que significa pós-modernidade, basta lembrar-se das excelentes avaliações feitas pelos colegas que me precederam nessa jornada de palestras. Não pretendo repetir tudo o que tem sido dito sobre a pós-modernidade. Nos anos 50, Paul Tillich escreveu um artigo com o título: “O fim da era protestante”, no qual sugeria que o protestantismo tradicional estava vivendo seu ocaso. Ele estava se referindo às igrejas que insistiam em se apegar aos modelos nascidos na época da Reforma. Tillich, porém, termina o artigo dizendo que, se a “era protestante” está chegando ao fim, isso não acontece com o “princípio protestante”. Sugiro a vocês lerem um pouco sobre o significado desse conceito “princípio protestante”, a respeito do qual também não temos tempo de comentar agora. De fato, não há como negar que o protestantismo tradicional está em crise porque nunca se renovou. O lema “Igreja reformada sempre se reformando” é muito bonito, mas muito perigoso, porque impede toda e qualquer institucionalização, que foi exatamente o que aconteceu com o protestantismo clássico, que nunca mais se reformou, apesar de todos os anos ouvirmos essa frase na semana comemorativa da reforma. O protestantismo que herdamos é fruto da modernidade. A Reforma foi um movimento moderno. Nasceu com a modernidade, legitimou a modernidade e cresceu com ela. Hoje, porém, sua crise e seu declínio correspondem também à crise da modernidade e ao advento da pós-modernidade. Em linhas gerais, o que se convencionou chamar “pós-modernidade” refere-se à constatação de que os grandes discursos de referência capazes de explicar o mundo (marxismo, capitalismo, psicanálise, freudianismo, positivismo, a ciência, a razão técnica e a teologia cristã tradicional) saturaram-se e já não são capazes de oferecer respostas significativas aos novos tempos. Alguns pós-modernos até mesmo renunciam à busca de respostas globais por entender ser isso impossível. Respira-se um clima de “morte das utopias”, fim dos grandes objetivos de transformação social e progresso e muita fragilidade e superficialidade nas relações interpessoais. A condição pós-moderna caracteriza-se pela deconstrução dos discursos e estatutos científicos e institucionais clássicos e, por conseguinte, por uma intensa fragmentação, dissolução de laços e fidelidades institucionais. Diante disso, sempre surgem vozes dizendo que a raiz dessa crise está no abandono da teologia da Reforma Protestante, que precisamos voltar a ela e que essa volta representaria a única esperança para o futuro do protestantismo clássico. Creio que isso é impossível. Hoje todos os sistemas estão caindo em ruínas e não devemos gastar energias em tentar segurá-los ou reeguê-los, mas procurar nas ruínas, pedaços que nos ajudem a construir pequenos abrigos.O que precisamos é perceber como os reformadores fizeram o que fizeram e não tanto nos apegar às" Desafios da Teologia Latino-americana para nossos dias. Fui muito enriquecido quando fazia o curso de graduação em teologia, sobretudo pela hermenêutica da suspeita e a interpretação bíblica na ótica dos pobres, dos oprimidos e dos que ficaram à margem da sociedade, tal como Jesus. Tive a oportunidade de lecionar Teologia Latino-americana em alguns seminários, mas quando comecei minha carreira docente, a TdL estava exatamente iniciando sua fase de revisão, na época da queda do muro de Berlim e do fim dos modelos de governo socialistas e comunistas na Europa Oriental. Não lhes falo a vocês propriamente como um teólogo da libertação, mas como alguém que reconhece seu valor em minha formação. Desse modo, pretendo desenvolver aqui algumas idéias pontuando alguns desafios impostos pelo atual contexto.A Teologia da Libertação não nasceu nos gabinetes europeus ou norte-americanos, mas na experiência de luta pela sobrevivência na América Latina. Essa resistência, inspirada pela fé levou algumas pessoas a tentar compreender a fonte dessa fé e a se identificar com processos semelhantes narrados nas escrituras sagradas cristãs. Desse modo, a Teologia da Libertação colocou no centro de suas preocupações a prática de libertação a partir da tradição do Êxodo, dos profetas populares e de Jesus, e não tanto a clareza nas definições dogmáticas. Assim, sempre deu mais importância à ortopraxia que à ortodoxia. Chamou a atenção dos cristãos para a miséria e exclusão sofridas pela maioria dos seres humanos e denunciou os pressupostos ideológicos de boa parte das teologias do primeiro mundo, não apenas as de nítida inspiração conservadora ou carismática, mas também as tidas como “liberais”. Preocupada com uma questão não prioritariamente doutrinária, mas prática - a própria vida – acabou por tornar-se a mais ecumênica de todas as teologias recentes. Católicos e protestantes de diferentes formações suspenderam seus pressupostos confessionais e puderam se encontrar e trabalhar juntos em torno de um ideal bem mais digno do que a defesa das instituições eclesiásticas. Por isso a Tdl acabou incomodando setores do Vaticano e dos centros ideológicos protestantes. A partir daí, a Teologia da Libertação obrigou as demais correntes teológicas a se perguntarem por sua relevância social. Ou seja, não basta que as teologias sejam ortodoxas, que seus argumentos internos sejam bem trabalhados ou sua relevância dialogal com a sociedade secular sejam firmes. O método da correlaçao entre teologia e filosofia. As teologias devem estar a serviço do plano de Deus, e não do orgulho dogmático ou sistemático ou da legitimação institucional. Portanto, a Teologia da Libertação acabou revelando-se, primeiramente uma iniciativa com preocupações éticas e pastorais e só num segundo momento, se revelaram as preocupações ditas “dogmáticas” ou “sistemáticas”.Apesar disso tudo, afirma-se atualmente que a Teologia da Libertação chegou ao fim ou que está em crise. De fato, por um lado, os ânimos se arrefeceram bastante. As Comunidades Eclesiais de Base se enfraqueceram e as utopias sociais, embora não tenham morrido, encontram-se em nítido estado de sonolência, adormecidas à espera de um beijo que as desperte. Porém, a libertação ainda não aconteceu e, ao contrário, a opressão econômica e a exclusão social aumentam na América Latina e em outros lugares. Desse modo, ao invés de dizer que a TdL chegou ao fim, é preferível dizer que aquele momento inicial da TdL passou e que agora ela amadureceu e se ramificou em vários desdobramentos que oferecem novas possibilidades de trabalho para os/as novos/as pastores/as e teólogos/as em nosso continente.Naturalmente, como todo movimento vivo, a TdL tem se preocupado em identificar os novos desafios do momento em que vivemos e apresentar respostas teológicas e pastorais adequadas. No âmbito acadêmico, a partir dos anos oitenta alguns teólogos da libertação começaram a perceber que a opressão tem várias faces, e que a luta contra a opressão sócio-econômica era apenas uma delas. Essa percepção levou a uma ampliação do leque das preocupações da TdL, principalmente quando o conceito “excluídos” toma o lugar do conceito “pobre”. Nos primeiros vinte anos da TdL o lema era “opção preferencial pelos pobres”. De repente, no início dos anos noventa emerge o conceito de excluídos (que abrange as opressões culturais e levanta os direitos das mulheres, das culturas negras e indígenas, migrantes, dos grupos GLS etc). Essa ampliação das preocupações causou, ao mesmo tempo a primeira crise interna. Alguns dos que defendiam o conceito “excluídos” diziam que o conceito “pobre” era muito reducionista, uma vez que há opressões que não são apenas de natureza econômica. Porém, à medida que o conceito “excluídos” substitui o conceito “pobre”, alguns teólogos da libertação mais antigos reagiram, alertando para uma infiltração burguesa na teologia da libertação que retirava a preocupação para com os pobres.Essa tensão não foi negativa, pois proporcionou um amadurecimento na teologia da libertação, em pelo menos duas áreas. Por um lado, os teólogos mais preocupados com a dimensão econômica (Franz hinkelammert, Hugo Assmann, Julio de Santa Ana e, mais recentemente, Jung Mo Sung) passaram a dedicar muita atenção a essa área e produziram muitas obras preciosas e de qualidade que, infelizmente, ainda são pouco conhecidas na maioria dos seminários evangélicos. Hoje percebe-se melhor os fatores que causam a pobreza e a importância de se pensar em soluções globais para problemas globais. Cada vez mais me convenço de que essa é uma área que merece muita atenção. Trata-se de um grande desafio a todos que se interessam por pensar os problemas econômicos e buscar alternativas solidárias capazes de enfrentar e exorcizar os principados e potestades que dominam a economia mundial. Por parte daqueles que insistiam no conceito de “excluídos” e que eram chamados “burguesia da libertação”, muita coisa boa também surgiu, especificamente no que se refere à pastoral libertadora da classe-média e à consciência de que a libertação deve alcançar todos, não apenas os oprimidos, mas também os opressores ou os que se beneficiam da opressão.Diante dessa situação, meu objetivo nesta noite é bastante simples. Pensando no tema que vocês me propuseram: “Desafios da teologia latino-americana para nossos dias”, pretendo esboçar um panorama de como vejo a situação do estudo da teologia, particularmente no Brasil. Não pretendo falar em termos de toda a América Latina, porque o tempo não nos permitiria. Além disso, não vou lhes propor um roteiro, mas apenas compartilhar o modo como eu mesmo encaro os desafios teológicos para nosso tempo. Ao esboçar esse panorama estarei também apontando para as fontes onde percebo sinais renovadores para a teologia em nosso país. Num segundo momento, quero propor algumas possíveis pontes entre a teologia latino-americana, que não pode perder de vistas nossas preocupações imediatas, mas também não pode se isolar num provincianismo e fechar as costas para tudo o que acontece de positivo no hemisfério norte. Ou seja, para mim, o grande desafio atual é estabelecer pontes entre o contexto da pós-modernidade e a teologia da libertação. I - A situação da teologia no Brasil
1. No âmbito católico-romano
Após o Concílio Vaticano I houve uma grande efervescência na teologia católica brasileira. Porém, a partir do papado de João Paulo II, gradativamente essa teologia começou a ser vigiada e seus representantes, perseguidos. O símbolo maior disso se deu quando no início dos anos oitenta, Leonardo Boff foi condenado a um tempo de silêncio obsequioso por causa do livro “Igreja, Carisma e Poder”, uma avaliação crítica da estrutura eclesiástica Católica Romana. Aos poucos, as instâncias de poder do Vaticano conseguiram minar também o trabalho das Comunidades Eclesiais de Base, fechar ou “reorganizar” seminários, dividir dioceses a fim de enfraquecer os movimentos mais críticos (como aconteceu na Arquidiocese de São Paulo) e silenciar teólogos. Em contrapartida, o Vaticano apoiou movimentos mais conservadores e pouco-críticos, destinados a atrair pessoas de volta à Igreja, o que tem conseguido com relativo sucesso através das missas-shows do Padre Marcelo, dos movimentos de renovação carismática e de pastorais ou movimentos voltados para a classe-média, como é o caso dos Focolares, Encontros de Casais com Cristo, etc. Alguns desses movimentos são apoiados financeiramente por grupos católicos extremamente conservadores e que atuam na surdina, como a Opus Dei. Atualmente, predomina nos principais centros de formação, uma orientação teológica atrelada às linhas atuais do Vaticano, estabelecidas no papado de João Paulo II. Boa parte dos atuais seminaristas e futuros padres da Igreja Católica Romana pouco conhecem dos fundamentos teóricos e metodológicos da TdL. Sinais de renovação teológica no âmbito do catolicismo romano só são vistos em alguns seminários, em cursos organizados por ONGs e movimentos internos (como a “Nova Igreja”) ou grupos ecumênicos como o CESEP e CEBI que, por não estarem atrelados diretamente à hierarquia romana, têm um pouco mais de liberdade de ação, embora lhes faltem os recursos financeiros. Não vejo, atualmente no catolicismo romano (ao menos em suas estruturas), sinais muito visíveis de fortalecimento de uma teologia crítica e diferente da que aí está, pois toda orientação teológica do Vaticano atualmente visa o fortalecimento da Igreja Católica Romana enquanto instituição. É claro que isso tudo pode mudar, de acordo com as orientações que emanarão do Vaticano após a eleição do sucessor de João Paulo II. Além disso, faz parte da fé, acreditar que o Espírito sempre pode reaparecer como vento que sacode as estruturas.
2. No âmbito protestante tradicional
A teologia feita nas Igrejas protestantes tradicionais do Brasil continua sendo herdeira da teologia dos missionários que trouxeram o protestantismo ao nosso país. Trata-se de uma teologia pouco aberta às relações ecumênicas, centrada no fortalecimento da instituição eclesiástica, de forte ênfase conversionista e recheada por uma densa camada de pietismo. Essa teologia sempre foi marcada muito mais pela repetição dos grandes manuais interpretativos dos líderes da Reforma, sobretudo aqueles surgidos nos seminários norte-americanos conservadores. Nos anos 60 e 70 surgiu no Brasil um bom grupo de teólogos dispostos a sacudir um pouco as igrejas protestantes tradicionais de sua letargia. Porém, tal como aconteceu no catolicismo romano, as igrejas protestantes tradicionais, conseguiram afastar essas vozes mais críticas e progressistas, que acabaram se refugiando em universidades ou migrando para outras atividades. Ocorre, porém, que os anos 80 e 90 trouxeram às igrejas protestantes tradicionais o impacto do movimento carismático, especialmente em sua capacidade para manter na igreja as gerações mais jovens, devidamente domesticadas através dos mantras religiosos entoados nos chamados “momentos de louvor”. Essa nova situação, ao mesmo tempo em que proporcionou às igrejas protestantes tradicionais uma sobrevida, também levou-as a uma série crise de identidade.Ultimamente, a crise financeira da maioria das igrejas tem levado seus líderes a considerar desperdício, o investimento feito em seminários e centros teológicos de pesquisa. A lógica da maioria das instituições nessas horas é sempre a mesma: ao invés de investir na formação teológica, é “mais sensato” reduzir gradativamente os investimentos em seminários e direcionar maior aporte financeiro a centros de formação missionária, onde os resultados são mais imediatos - num tempo mais curto, treina-se um missionário ou evangelista e passa-se sobre ele um verniz teológico, evitando, de preferência, que essa formação seja muito crítica. Semelhantemente ao que acontece no âmbito romano, os programas teológicos das igrejas protestantes também visam em primeiro lugar o fortalecimento da instituição e a garantia de sua continuidade, a partir da formação de lideranças que garantirão a reprodução da instituição. Por isso, no momento, não vejo nas instâncias institucionais das Igrejas Protestantes muitas possibilidades de renovação da teologia.
3. No âmbito evangélico-carismático-pentecostal
Reuni essas três palavras num mesmo “tipo ideal” talvez de modo prematuro. Em todo caso, penso que as bases teológicas dessas três expressões religiosas são muito semelhantes. As igrejas pentecostais são herdeiras do movimento pietista-wesleyano. Durante boa parte do século XX, algumas igrejas pentecostais no Brasil consideravam o estudo da “teologia”, coisa do demônio, sem perceber que todos os seus discursos, sermões, pregações, etc, são herdeiros de uma determinada teologia. Quando abandonaram essa ingenuidade inicial, alguns grupos pentecostais começaram a criar cursos, geralmente com o nome de “institutos bíblicos”, “cursos de formação de obreiros ou evangelistas”, etc. O objetivo principal era semelhante aos centros de formação missionária das igrejas protestantes tradicionais – oferecer aos futuros reprodutores do discurso institucional um conhecimento bíblico mínimo e, desse modo, garantir a reprodução da instituição. Geralmente nesses institutos bíblicos, a formação teológica é bastante rasa e introdutória, mas transmitida de modo a fazer com que os receptores acreditem que tudo o que precisam saber ou conhecer está ali e que tudo o que vier além daquilo, “é coisa do diabo”. Na minha experiência como professor de teologia, posso testemunhar de diversos alunos que tive oriundos de seminários ou institutos bíblicos dessa natureza, que chegaram ao curso de teologia apenas para cumprir a obrigação de estudar para conseguir um diploma. Mas vinham todos já com certezas absolutas. E ao final do primeiro ano, ou mesmo do primeiro semestre de estudo, descobriam que, até então, estavam se alimentando apenas de leite. Por ser um ensino reprodutivo, pouco aberto às pesquisas mais atuais da teologia e pouco aberto ao diálogo ecumênico, também não vejo nenhum sinal de que a renovação da teologia no Brasil possa vir desses grupos.
4. No âmbito ecumênico
A partir dos anos sessenta começou a se desenvolver no Brasil o movimento ecumênico de modo mais intenso. Diversos organismos e institutos ecumênicos foram criados nos bons tempos em que ainda havia muitas verbas para tanto. Apesar de alguns percalços, o movimento ecumênico só trouxe benefícios para a teologia no Brasil. A ASTE é um desses frutos, bem como organismos aqui já citados, como o CESEP e CEBI, além do CLAI, CEBEP, CONIC, o antigo CEDI, agora Koinonia e o Instituto Ecumênico de Pós-graduação em Ciências da Religião de São Bernardo do Campo, que, embora hospedado numa instituição confessional (Universidade Metodista), trabalha com bastante autonomia e liberdade. Fazendo um retrospecto dos últimos vinte ou trinta anos de produção teológica no Brasil, observo que tudo o que houve de novidade, de acréscimo, tudo o que não foi mera repetição, surgiu nesses ambientes ecumênicos mais arejados. O método popular de leitura da Bíblia, as articulações pastorais, a renovação litúrgica (ainda não encampada pelas Igrejas), a nova hinologia latino-americana, em geral foram produzidas por pessoas e grupos envolvidos no movimento ecumênico e não por iniciativas confessionais isoladas. Apesar de as igrejas protestantes tradicionais atualmente darem pouca atenção ao movimento ecumênico, esse é um dos poucos espaços onde vislumbro humanamente alguma esperança concreta para a renovação da teologia no Brasil. Se há algum conselho que eu possa dar aos meus alunos de teologia é esse: invistam seu tempo de férias, seus fins de semana livres, feriados, etc, na participação de encontros ecumênicos que estão sempre acontecendo pelo Brasil. Muita gente diz que não participa porque não são divulgados. Isso é preguiça de buscar informações. Procurem na internet os endereços de sites ecumênicos no Brasil (geralmente todos têm algum boletim informativo, ou pelo menos, o número do telefone). Quem procura, acha!
5. No âmbito acadêmico
Boa parte dos movimentos de renovação teológica não surgiu por esforços institucionais de igrejas estabelecidas. A história tem mostrado que todas as instituições tendem a se tornar conservadoras e a inibir a criatividade. Isso acontece também com as igrejas estabelecidas e com grupos pára-eclesiásticos institucionalizados. Se fizermos uma retrospectiva de tudo o que surgiu na teologia do século XX, por exemplo, veremos que as grandes pesquisas bíblicas no AT e NT, a aplicação da sociologia e da historiografia crítica aos textos bíblicos, a nova hermenêutica e as mais ousadas novidades teológicas sempre surgem primeiro em âmbitos acadêmicos – universidades e centros de pesquisa. Elas sempre estão à frente das Igrejas, e as igrejas só aos poucos vão assimilando, geralmente com bastante atraso, os resultados das novas pesquisas teológicas. Apenas alguns exemplos: Paul Tillich é um dos teólogos mais influentes do século XX. Nos anos 80 e 90 surgiram diversos grupos de estudo sobre o pensamento de Tillich em várias partes do mundo. Hoje há bem organizadas sociedades de estudo da teologia de Tillich nos EUA, Canadá, em vários países da Europa e uma aqui no Brasil. Porém, a recepção do pensamento de Tillich por parte das igrejas no Brasil ainda é diminuta. O mesmo pode ser dito na área de estudos bíblicos. O estudo de Gerd Theissen, Meeks, Ched Myers, Andrew Overman, o Context Group, etc, ainda é privilégio de poucos interessados em comprar algumas dessas obras já traduzidas ou pesquisar sobre elas na internet.Se me perguntarem pelos sinais de renovação teológica atualmente no mundo, eu lhes apontarei essas duas fontes: o mundo ecumênico e os centros de pesquisa acadêmicos. Se vocês não quiserem ser meros estudantes que reproduzirão a teologia já feita por outros, procurem se integrar com os centros de pesquisa teológica nas universidades e em grupos de estudo. Ali se faz pesquisa de ponta e muito do que é discutido hoje, só será assimilado pelas igrejas dentro de alguns anos, pois, na maioria dos casos, a Igreja está sempre atrasada em relação aos movimentos históricos. Conversando com alguns colegas que lecionam Teologia Contemporânea em diversos seminários, percebo que, para eles, teologia contemporânea anda significa estudar Barth, Bultmann e Tillich, que nem são mais “contemporâneos”, pois estão todos mortos. É claro, que boa parte dos novos estudantes precisa pelo menos ser iniciada nesses grandes nomes. Mas eu, particularmente, acho que Teologia Contemporânea diz respeito àquilo que está sendo produzido por gente viva, ativa e pouco conhecida.É claro que essa interação com a vida acadêmica não pode ser feita como um mero exercício de masturbação intelectual. Naturalmente, é imprescindível associar essa interação com a vida acadêmica à participação na comunhão da Igreja. A teologia deve ser serva da Igreja – uma instância crítica inseparável da comunhão, como a consciência, que não existe fora do ser, fora do corpo do indivíduo.
Por Carlos Eduardo B. Calvani