15 agosto, 2006

Breve comentário sobre: "O homem e o tempo na perspectiva de Agostinho"

Paradoxalmente à presciência de Deus, não obstante ao fato de confessarmos nossas misérias a Ele, parece redundante. Porém, somos chamados por Ele para sermos pobres de espírito e mansos, para termos fome e sede de justiça, e por conseqüência sermos misericordiosos, puros e pacíficos. A confissão de tudo isto patenteia o nosso amor a Deus.
Agostinho em sua oração evocando as “bem aventuranças” de Jesus, resultado de uma confissão humilde de reconhecimento do estado humano limitado e de pecado, nos leva a uma compreensão empírica de que embora Deus como o Senhor da eternidade, vendo no tempo o que se passa no tempo, deseja mesmo assim nossas confissões e petições. Isto é como uma forma de excitação do nosso afeto com Ele.
Com grande destreza Agostinho no leva a pensar que diante da grandeza das palavras Divinas ao passo que a tornam enigmáticas e distantes da total compreensão humana, o tempo é por demais-precioso para enumerar todas as solicitações, terrores, consolações e incitamentos que Deus nos introduziu a pregar a Sua palavra e a Sua doutrina ao povo.
A criação do céu e da terra é focalizada agora sob o prisma de Moisés, pelo qual Agostinho desejaria saber o sentido da frase “No princípio criaste o céu e a terra”. Mas como Agostinho saberia se Moisés falava a verdade? Seria uma mera tentativa humana de encontrar respostas limitadas no tempo pela transitoriedade das palavras?
A alternativa de Agostinho imediatamente a isto, é poematizar a criação, tendo Deus como o Grande Criador e protagonista que sujeitou o céu e a terra às suas mudanças e vicissitudes. Logo Ele é a palavra criadora, procedendo como um artífice que forma um corpo de outro corpo, impondo-lhe, segundo a concepção da sua mente vigorosa. As indagações permeiam ainda o cerne do sentido axiomático da criação. Agostinho usando uma retórica peculiar as suas assertivas, indaga: “Que criatura existe que não exija a Vossa existência?”. A conclusão é sucinta: Deus falou e os seres foram criados. “Vós os criastes pelas vossas palavras”.
A despeito disto, Agostinho interpele: Mas como é que falastes? Na busca da resposta ele faz a seguinte indagação: “ Porventura do mesmo modo como quanto se ouviu de entre a nuvem a voz que dizia: “Este é o meu Filho predileto”?” É notório o aspecto didático nas palavras de Agostinho. Quando ressalta o fator das palavras transitórias que são absorvidas por ouvidos externos, à inteligência que as compreende e cujos órgãos interiores da audição estão dispostos para escutarem o Vosso Verbo Eterno.
Como convidados a compreender o Verbo, somos instigados por Agostinho a pensar no Verbo eterno e coeterno com Deus, o qual é pronunciado por toda a eternidade e no qual tudo é pronunciado eternamente. Não há diferença nenhuma entre o dizer e o criar. Portanto, o que Deus faz com a Sua palavra se realiza simultaneamente e desde toda a eternidade. Assim Agostinho introduz seu pensamento em torno da eternidade relacionada ao tempo em que o homem está inserido.
Como discípulos do Verbo, ouvimos sua voz no nosso interior. Sua luz nos ilumina e nos faz mais sábios. No entanto, Sua vontade é soberana sobre todos os aspectos. Por conseguinte, nada seria criado sem antes existir a vontade do Criador. O tempo é limitado por Deus, pois o mesmo não pode medir a Sua Eternidade. Agostinho nos leva a refletir sobre o grau de pequenez humana numa excepcional indagação: “Quem poderá prender o coração do homem, para que pare e veja como a eternidade imóvel determina o futuro e o passado, não sendo nem passado e nem futuro?”
A eternidade de Deus impossibilita o homem, como ser temporal, portanto criatura, de alcançar a grandeza do seu Criador. Deus está acima do tempo, pois Ele é a própria existência. Se o homem depende do tempo e está sob seu domínio, imagine sua dependência de quem está acima do próprio tempo. Agostinho expõe isto de maneira sintética e objetiva relacionando-se a Deus: “Não houve tempo nenhum em que não fizésseis alguma coisa, pois fazíeis o próprio tempo”.
Portanto, é quase um impropério afirmarmos que o tempo divide-se em três: pretérito, presente e futuro. Se agimos dentro de uma limitação temporal, logo nos encontramos em um estado plenamente transitório, no qual devemos reconhecer que somos criaturas do Criador e também Senhor do próprio tempo. Que nos permite apenas experienciar a existência que nos é facultada pela vida, subordinada ao Eterno e Soberano Deus.

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